[Sermão] Os deveres dos brasileiros na devoção à Nossa Senhora Aparecida

Sermão para a Festa de Nossa Senhora Aparecida
12 de outubro de 2014 – Padre Daniel Pinheiro

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Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria.

ND-Aparecida-patrona-BrasiliaeCaros católicos, desde o seu descobrimento pelos portugueses, Maria, Mãe de Deus e nossa, é venerada no Brasil. Quis, porém, a divina providência, que dispõe todas as coisas com suavidade e força, segundo a sua sabedoria, que um episódio no Rio Paraíba, no interior do estado de São Paulo, incrementasse ainda mais essa devoção filial dos brasileiros por Nossa Senhora. Em 1717, três pescadores, Domingos Garcia, João Alves e Felipe Pedroso, pescavam, sem sucesso, havia longas horas. Eis, então, que João Alves lançou mais uma vez a rede e colheu, do fundo do Paraíba, o corpo de uma imagem de Nossa Senhora da Conceição. Em seguida, lançando mais abaixo novamente a rede, colhe a cabeça dessa mesma imagem de Nossa Senhora da Conceição. Tendo guardado as duas partes da imagem com cuidado, continuaram a pesca, com grande sucesso, ao ponto de terem que parar para não naufragarem, tal a quantidade de peixes. Que esteja aí o dedo de Deus, não há muita dúvida. Maria Santíssima, por meio da veneração dessa imagem encontrada decapitada no fundo de um Rio, começou a conceder favores, graças, milagres aos que vinham venerá-la. Construiu-se um oratório. A devoção foi se espalhando na região e em todo o país. Cada vez mais pessoas recebiam os favores de Nossa Senhora da Conceição, que recebeu o nome de Aparecida, Nossa Senhora da Conceição Aparecida. No ano de 1900 tiveram início as peregrinações diocesanas ao Santuário de Nossa Senhora Aparecida. No dia 8 de setembro de 1904 a imagem veneranda foi coroada por ordem do Santo Padre, que era São Pio X. Estavam aí os representantes do clero, um grande número de fiéis e mesmo o presidente da república estava representado.  Foi, porém, somente em 1930, em 16 de julho, Festa de Nossa Senhora do Carmo, que o Papa Pio XI decretou Nossa Senhora Aparecida como padroeira principal de todo Brasil. Pouco tempo depois, em 31 de maio de 1931, O cardeal Leme consagrou o Brasil a Nossa Senhora Aparecida, com as mesmas palavras que iremos utilizar após a Missa para entregar o Brasil nas mãos de Maria.

Nossa Senhora, sob o título de Aparecida, é, então, padroeira de nossa pátria. E, como padroeira, Maria Santíssima tem, se podemos assim dizer, certas obrigações para conosco. E nós temos nossas obrigações para com ela. Maria, como Padroeira do Brasil, intercede por ele, nos alcança graças, vigia sobre nosso povo, nossas famílias. Todavia, Nossa Senhora, não pode nos ajudar mais do que queremos ser ajudados. Precisamos, então, nós cumprir os nossos deveres de súditos de Maria Santíssima, para que ela possa nos procurar maiores favores, maiores graças, e a restauração de nosso país como uma sociedade católica, como é a sua vocação desde a providencial colonização portuguesa. Se em nosso país a derrocada ainda não foi completa (por exemplo, com a instauração de uma ditadura anticristã, ou com a aprovação plena do aborto), é unicamente em virtude da mão protetora de Nossa Senhora Aparecida. Apesar da infidelidade nossa, apesar da infidelidade da maior parte de nós brasileiros e dos nossos chefes, Nossa Senhora ainda tem nos preservado de males maiores. Nossa Senhora não deixa de cumprir, como Padroeira, aquilo que é o seu dever. Precisamos, também nós, caros católicos, cumprir nossos deveres para com a nossa padroeira. Se cumprirmos nossos deveres para com Maria, ela poderá nos ajudar realmente como quer, como deseja, nos conduzindo à santidade e ao céu.

Precisamos fazer a nossa parte, precisamos reconhecer Maria como padroeira da nossa pátria não somente em teoria, mas também na prática. Nosso primeiro dever é recorrer a ela, rezar a Nossa Senhora Aparecida, para que ela proteja o Brasil e para que faça que nosso caro país se submeta às leis de Cristo e da sua Igreja. Rezar, invocar Nossa Senhora Aparecida pelo país, mas também pelas famílias, pois um país não é um ente abstrato, mas é formado pelas famílias que o compõem, por nossas famílias. Peçamos a Nossa Senhora Aparecida, então, pelas famílias, pelas nossas famílias em primeiro lugar, e peçamos que ela reine sobre as famílias, juntamente com o Sagrado Coração de Jesus. Rezar pelas famílias, mas também pelos governantes. Não se enganar nem ofender a Deus, pensando que nem adianta rezar por tal ou tal governante. Não tenham dúvida, caros católicos, adianta e muito rezar pelos governantes, ainda que sejam os mais iníquos. Deus, se Ele quiser, pode amolecer qualquer coração, por mais endurecido que seja. É preciso também rezar pelo clero brasileiro, para que possa ensinar realmente a doutrina de Nosso Senhor Jesus Cristo, para que possa santificar as almas, para que posa governar o povo, dirigindo-o a Deus. Rezar pelo clero, pelas famílias, pelos governantes, pelo povo todo.

Nosso segundo dever, depois da oração, é procurar viver como dignos filhos de Maria Santíssima. Seremos dignos filhos dela se nos assemelharmos a ela, procurando imitar as suas virtudes no nosso estado de vida. Seremos dignos filhos de Maria se nos assemelharmos a Nosso Senhor Jesus Cristo. Devemos, então, procurar honrar nossa padroeira e a mãe do Brasil, nos comportando em dignos filhos dela.

Nosso terceiro dever, caros católicos, é reconhecer, com grande gratidão, todos os bens que ela nos deu. Pela intercessão dela, temos recebido todos os bens das mãos de Deus. Todo bem que recebeu e recebe o Brasil vem por meio de Nossa Senhora.

Assim dispostos, quer dizer, invocando-a, procurando imitá-la e gratos, Maria Santíssima poderá nos ajudar com abundância ainda maior e livrar nosso país dos mais terríveis erros, que rejeitam Deus e suas leis santas. Procuremos ter uma verdadeira devoção a Nossa Senhora Aparecida, caros católicos.

Na hora em que começarmos a cair no desânimo ou na desesperança, recorramos a Nossa Senhora. Também os pescadores já estavam desanimados na sua longa e estéril pesca… até encontrar Maria. Devemos ir a Maria.

Glória a vós, Maria, que esmagais as heresias e o demônio: sede nossa bondosa guia. Glória a vós, refúgio dos pecadores, intercedei por nós junto ao Senhor. Glória a vós, Maria, Senhora do Brasil sob o Título de Nossa Senhora Aparecida, tende piedade de nós e conduzi esse vosso povo ao vosso Filho, Jesus Cristo.

É preciso rezar o Terço, caros católicos. Ele é a arma da nossa esperança.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

[Sermão] O Santo Rosário: arma de nossa esperança

Sermão para a Solenidade da Festa do Santo Rosário
5 de outubro de 2014 – Padre Daniel Pinheiro

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Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria.

“Que, meditando nos mistérios do Sacratíssimo Rosário da Santíssima Virgem, aprendamos a viver as lições que eles encerram, para alcançarmos as graças que prometem.” (Coleta da Missa)

Caros católicos, os tempos não são fáceis. Diante de tantas dificuldades e diante dos maiores absurdos contra a lei divina, natural e revelada, diante das afrontas a Nosso Senhor Jesus Cristo e a sua Igreja, diante dos ataques constantes à família e às verdadeiras virtudes individuais e sociais, existe uma grande tentação de desespero ou de profundo desânimo da parte da alma católica. Dirigindo-se a Deus em um lamento, essa alma pode chegar ao excesso de dizer: “Meu Deus, é impossível ser um bom católico nesse mundo atual, é impossível educar bem, para a virtude, para o céu, os nossos filhos.” Diante de tantos males, essa é uma grande tentação.

Todavia, caros católicos, face a essa situação quase incompreensível para quem guarda um pouco de bom senso, é preciso manter a esperança. A esperança é uma das três virtudes teologais, ao lado da fé e da caridade. São chamadas de virtudes teologais porque se referem diretamente a Deus. A fé se refere a Deus enquanto Ele é a verdade primeira, que não se engana nem nos engana, e à qual devemos aderir. A caridade se refere a Deus enquanto Ele é o Sumo Bem, que deve ser por nós amado em si mesmo. A esperança se refere a Deus enquanto Ele é a nossa bem-aventurança eterna. A esperança é a virtude sobrenatural infundida por Deus em nossas almas pela qual esperamos com confiança firmíssima que Deus nos dará a bem-aventurança eterna e os meios necessários para alcançá-la. Essa esperança é fundada na onipotência e na misericórdia divinas. E, claro, precisamos nós fazer a nossa parte, sendo fiéis às graças que Deus nos dá e procurando sermos católicos fiéis. Sem a esperança, ficaremos paralisados diante do triunfo aparente do mal.

Podemos e devemos, então, caros católicos, ter essa confiança firmíssima de que Deus nos dá os meios para alcançarmos o céu. Mesmo nas circunstâncias mais difíceis, mesmo nesse estado atual da sociedade, Deus nos dá os meios e meios abundantes para nos convertermos, para perseverarmos na graça. Podemos ter essa esperança firme porque Deus é onipotente e misericordioso. Se Ele é onipotente, Ele tem, efetivamente, os meios para nos ajudar. Se Ele é misericordioso, Ele quer realmente nos ajudar, nos tirando de nossas misérias. Não poderíamos esperar em alguém que pode nos ajudar, mas que não quer nos ajudar, assim como não podemos esperar em quem quer nos ajudar, mas que não tem os meios para isso. Mas devemos esperar em Deus que é onipotente e misericordioso. Ele pode e quer nos ajudar.

Deus Nosso Senhor quis que vivêssemos nessas circunstâncias em que nos encontramos atualmente. E mesmo nessas circunstâncias, Ele não nos abandona, Ele nos dá os meios para sermos bons católicos, para educarmos as crianças. Do contrário, precisaríamos afirmar que Deus é um Deus cruel, que nos colocou em situação na qual é impossível nos salvarmos. Um Deus que exige que sejamos santos, mas não nos dá os meios para tanto, seria um Deus cruel. Deus nos dá, mesmo nessa sociedade corrompida nos seus mais profundos fundamentos, meios abundantes para nossa santificação. Não devemos ceder ao desânimo, nem nos desesperar, nem nos exasperar. Devemos, isso sim, manter essa esperança sobrenatural e fazer a nossa parte, esforçando-nos para vivermos como bons católicos.

Para preservar essa esperança, é preciso, primeiramente, ter uma fé viva. A esperança é esperar da onipotência divina e da sua misericórdia o céu e os meios para alcançá-los. Para ter esperança em alguém, eu preciso, antes, acreditar nesse alguém. Antes de ter esperança, preciso ter uma fé viva. Uma fé viva não é um sentimento. Uma fé viva é aquela que, pela adesão às verdades reveladas, nos possibilita realmente ter uma visão sobrenatural das coisas, enxergá-las sempre a partir da eternidade. Não devemos reduzir – e seria erro grave fazê-lo – nossa vida a algo puramente natural, como se não contássemos com a ajuda de Deus ou como se nossa vida se limitasse a esse mundo. Devemos ver as coisas com espírito de fé, com espírito sobrenatural, sabendo que Deus governa todas as coisas, permitindo os males como castigo e para tirar deles um maior bem. É Deus quem governa todas as coisas, mesmo quando tudo parece perdido. Na Cruz, quando tudo parecia perdido, na visão ainda muito terrena dos apóstolos e da maioria dos discípulos, Nosso Senhor triunfava. Devemos saber que estamos nesse mundo para alcançar a vida eterna. Portanto, espírito de fé e visão sobrenatural das coisas. Não olhar as coisas com uma lupa e com uma visão humana, mas olhá-las a partir da visão divina, o que nos é possível pela fé e pela esperança.

Além da fé viva e da consequente visão sobrenatural das coisas, é preciso, para ter uma esperança sobrenatural, que procuremos, seriamente, exercer as virtudes, que procuremos seriamente amar a Deus, praticando os seus mandamentos. Não podemos esperar realmente de Deus se não fizermos a nossa parte. E, claro, é preciso oração. É preciso rezar sempre, nos diz Nosso Senhor.

Os meios de se preservar a esperança estão contidos no Santo Rosário, caros católicos. Os remédios para vencermos esses nossos tempos difíceis estão resumidos no Santo Rosário. O Papa Leão XIII, pontífice durante longos anos no final do século XIX e bem no início do século XX, costumava escrever no mês de outubro uma Encíclica sobre o Rosário. Ele o fazia porque entendia que era o Rosário remédio muito eficaz contra os males do tempo. E quais eram os males do tempo de Leão XIII? Exatamente os mesmos males que nós temos hoje. A diferença é que naquela época os males ainda estavam nas sementes, nos princípios. Hoje, nós vemos esses males nas suas consequências concretas e claras: o indiferentismo religioso, a Igreja em pé de igualdade com outras religiões, o relativismo moral, o laicismo. E não há dúvida, caros católicos, ao lado do Santo Sacrifício da Missa, ao lado dos sacramentos, a nossa grande arma é o Santo Rosário. O Santo Rosário é a arma da nossa esperança.

O Santo Rosário é a arma da nossa esperança, antes de tudo, porque ele é uma oração excelente. Excelente porque é composta das mais perfeitas orações, que são o Pai-Nosso, a Ave-Maria e o Credo. Excelente na sua origem porque nos foi dado por Nossa Senhora, há vários séculos, por meio de São Domingos, cuja relíquia está sobre o altar.

O Santo Rosário é a arma da Nossa Esperança porque ele nos traz uma fé viva e uma visão sobrenatural das coisas a partir da consideração dos mistérios da vida de Nosso Senhor e de Nossa Senhora.

O Santo Rosário é a arma da nossa esperança porque ele nos incita à virtude, nos fazendo meditar o exemplo perfeito de Nosso Senhor e de Nossa Senhora, contido nos mistérios gozosos, dolorosos e gloriosos.

O Santo Rosário é a arma da nossa esperança porque a história mostra a sua eficácia. Foi por ele que são Domingos converteu os hereges cátaros. Foi por ele que os católicos venceram, na batalha de Lepanto, o flagelo maometano, que ameaçava a cristandade.

O Santo Rosário é a arma de nossa esperança porque é a oração mais agradável a Nossa Senhora, nossa medianeira e nossa Mãe. Nossa Senhora não ficará surda ao terço bem rezado. E Nossa Senhora esmaga todas as heresias e todos os erros. Ela há de esmagar também os erros dos nossos tempos, se recorrermos a Ela pelo Santo Terço. Ela há de esmagar o modernismo, ela há de esmagar o laicismo, ela há de esmagar o relativismo.

É urgente, caros católicos, pegarmos esse objeto simples, de 59 contas e um crucifixo, e começarmos a rezar com confiança em Nossa Senhora e em Deus. É urgente e obrigação nossa rezar o Terço diariamente. Não adianta lamentar os males de nossa época, se não recitamos essa oração simples, mas eficaz, que é o Santo Terço. É urgente e necessário recitar o Terço diário, caros católicos, e procurar rezá-lo em família. Pai, mãe e filhos. Não é exortação piedosa piegas, caros católicos. É meio para se guardar a fé, a esperança e a caridade. É meio de perseverarmos no bem nesses tempos de calamidade religiosa e moral.

Aqueles que ainda não rezam o Santo Terço diariamente, aproveitem o mês de outubro, mês do rosário, instituído como tal justamente por Leão XIII, para tomar a resolução de recitar o Terço diariamente. Aqueles que já o rezam diariamente poderiam tentar, com generosidade, rezar o Rosário, que, tradicionalmente, são três Terços.

É preciso rezar o Terço, caros católicos. Ele é a arma da nossa esperança.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

[Sermão] O modernismo, a pior das heresias

Sermão para o XVI Domingo depois de Pentecostes
28 de setembro de 2014 – Padre Daniel Pinheiro

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Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria.

Caros católicos, no último dia 3 de setembro, a Igreja comemorou a festa do Papa São Pio X. Giuseppe Sarto foi pároco de uma pequena cidade, Bispo de Mântua, cardeal Patriarca de Veneza e, finalmente, Papa, de 1903 a 1914. Nós estamos, então, no ano do centenário de seu falecimento. São Pio X foi um Papa Santo, que soube governar a Igreja com as virtudes de um verdadeiro chefe e pai. Dentre os melhores e mais importantes atos de São Pio X está o combate veemente que ele fez ao pernicioso erro do modernismo, que ele chamou de síntese de todas as heresias ou, segundo outras traduções, de esgoto coletor de todas as heresias. Esse erro que São Pio X combateu com tanta força resistiu ao tempo e triunfou mesmo no seio da Igreja, com tantos danos para as almas.

O modernismo, síntese de todas as heresias, destrói a religião católica, caros católicos. O modernismo se baseia em dois princípios da filosofia moderna: o agnosticismo e o imanentismo. O modernismo se baseia no agnosticismo. Isto significa que o modernismo nega que nós possamos conhecer a verdade objetiva tal como ela é. Não podemos conhecer as coisas tais como elas são, mas temos simplesmente impressões das coisas nos diz esse erro. Assim, também não podemos conhecer se Deus existe ou não. Deus não pode se revelar aos homens, nos dizendo verdades a crer ou coisas a fazer. Enfim, não temos acesso a Deus. Não podemos saber se Ele existe e Ele não pode se revelar a nós. Esse erro do agnosticismo é próprio da filosofia moderna, e tem seu início com Descartes, passando por Kant e outros filósofos modernos.

Essa impossibilidade de conhecer a realidade exterior – que a filosofia moderna afirma erroneamente – fecha o homem em si mesmo, no mundo das suas ideias. Assim, para o homem só tem valor o que sai dele mesmo, passa a ser verdade unicamente o que tem origem nele. Só serve para o homem o que emana dele mesmo. É o princípio da imanência. O modernismo nega, então, que a religião seja revelada por Deus aos homens e afirma que a religião vem do próprio homem, de um confuso sentimento religioso que está no homem. A religião não seria nada mais do que esse sentimento que está no homem. Os dogmas nada mais seriam do que a expressão imperfeita e sempre inadequada desse sentimento que está no homem. A doutrina católica nada mais seria do que uma invenção dos homens para satisfazer esse sentimento religioso. Mas, como o sentimento é algo que muda ao longo do tempo, seria preciso mudar também a doutrina católica, os dogmas, para adaptar tudo isso ao sentimento religioso que muda. Os dogmas devem evoluir. Se hoje, por exemplo, as pessoas já não aceitam mais a indissolubilidade do matrimônio, seria preciso mudar isso, para satisfazer o sentimento religioso das pessoas. Nós vemos, então, que o modernismo torna a religião algo puramente subjetivo, ao negar que nós podemos conhecer a existência de Deus, ao negar que Deus pode se revelar a nós e ao afirmar, em contrapartida, que só tem valor o que vem de nós. Cada um faz a sua própria religião, desde que se sinta bem na religião que fabricou ou escolheu. Assim, se a pessoa já não se sente bem na Igreja Católica porque ela quer se divorciar e casar novamente, ela passará para uma seita qualquer, onde pode fazer o que bem entende e se sentir bem com isso, achando que, se sentindo bem, estará em união com Deus. O homem toma o lugar de Deus e faz a sua própria religião, define as suas verdades. Tudo, no modernismo, deve ser voltado para o homem. A religião não é mais para aderir às verdades que Deus revelou e para amá-lo fazendo a vontade dEle. Não, a religião passa a ser simplesmente algo para satisfazer o homem, em função do homem. A religião passa a ser algo para fazer o homem se sentir bem e ela tem que se adaptar à mentalidade dos homens para que eles se sintam bem. É exatamente isso que nós vemos hoje em dia. Muitos querem adaptar a Igreja Católica à mentalidade moderna. Já não se aceita mais a noção de uma sociedade hierárquica: é preciso igualar sacerdotes e leigos. Esses últimos devem distribuir a comunhão, devem fazer as leituras, devem usar roupas de distinção, etc. Já não se aceita mais a diferença entre homem e mulher: é preciso que a mulher seja ordenada sacerdotisa. Já não se aceita mais a noção de sacrifício: é preciso tentar reduzir a Missa a uma mera ceia, a uma mera refeição. Já não se aceita mais o teocentrismo: é preciso colocar a liturgia em vernáculo, é preciso que o padre esteja virado para o povo. Já não se aceita mais a indissolubilidade do matrimônio: é preciso dar a comunhão aos católicos divorciados recasados. Já não se aceita mais a possibilidade do pecado: não é preciso mais confessar e o padre não deve falar sobre o pecado no sermão.  Já não se aceita mais a presença real de Cristo em corpo, sangue, alma e divindade nas espécies consagradas: é preciso dizer que se trata de uma presença simbólica. Já não se aceita mais um estado que confesse a religião católica: é preciso defender o estado laico. E assim por diante, caros católicos. Quantas consequências funestas do modernismo que nós vemos por toda parte mesmo nos meios católicos.

Além disso, caros católicos, é forçoso constatar que cada um tem um sentimento religioso distinto, de forma que alguns podem satisfazer esse sentimento religioso com o catolicismo, outros com o protestantismo, outros com o islamismo, outros com a umbanda, etc. E tudo o que satisfaz o sentimento religioso é verdadeiro. Consequentemente, todas essas religiões ou doutrinas são verdadeiras, na medida em que satisfazem o sentimento religioso de uma pessoa ou de um grupo. Esse entendimento da fé como sentimento, entendimento que é próprio do modernismo, leva à mais completa indiferença religiosa: todas as religiões passam a se equivaler, todas as religiões são boas, pois há pessoas que se sentem bem nelas. Quantas vezes ouvimos: o importante é a pessoa se sentir bem. O importante não é a pessoa se sentir bem. Se sentir bem ou mal não tem muita importância. O importante é a pessoa fazer o bem, seguindo a vontade de Deus, cumprindo os mandamentos. Nosso Senhor, no Jardim das Oliveiras, ao dizer que sua alma estava triste até à morte, não estava se sentindo bem, caros católicos. Mas fazia a vontade de Deus. Na cruz, Nosso Senhor, ao dizer “Meu Deus, Meu Deus por que me abandonaste?”, não estava se sentindo bem, mas estava fazendo um grande bem, Ele estava fazendo a vontade de Deus para nos redimir.

O quanto o modernismo e suas consequências são opostas à realidade das coisas deve estar muito claro para todos nós. O modernismo, baseando-se na filosofia moderna, destrói tudo. Não sobra pedra sobre pedra, como vimos. Vejamos a verdade das coisas, baseada na sã filosofia e na doutrina católica. Que Deus existe, caros católicos, nós podemos conhecer pela nossa razão. Aristóteles, filósofo pagão, já havia provado a existência de Deus. Do nada, nada se faz. Do caos ou do acaso não pode vir a ordem. Do menor ou do menos perfeito não pode vir o maior ou o mais perfeito. É preciso um ser que criou tudo o que existe e que não foi criado. Com coisas tão perfeitas na natureza e com tanta ordem, é preciso uma inteligência que pensou e executou tudo quanto existe. É irracional negar ou duvidar da existência de Deus. Como nos diz a Sagrada Escritura: dixit insipens in corde suo, non est Deus (disse o tolo em seu coração, Deus não existe). É preciso realmente ser tolo ou estar cego pelas paixões desordenadas para não chegar à conclusão de que Deus existe. Deus existe e sendo um ser inteligente e onipotente, Ele pode se comunicar a nós, Ele pode se revelar a nós. E nós, sendo também seres inteligentes, podemos receber a revelação divina e podemos ser elevados por ela. E nossa razão nos mostra que se Deus nos fala, devemos aderir de modo absoluto, com certeza absoluta e sem nenhuma dúvida, porque Deus não pode se enganar nem nos enganar. E Ele, de fato, se revelou a nós. Deus nos falou e enviou seu próprio Filho, Nosso Senhor Jesus Cristo, que nos mostra sua missão divina ao longo de todo o Evangelho, com obras divinas, com ensinamentos divinos. Nosso Senhor nos falou e Ele fundou sua Igreja, sobre Pedro, para perpetuar até a consumação dos séculos a sua obra redentora, para guardar intactos os seus ensinamentos. É a Igreja católica. Não somos nós, caros católicos, que criamos a religião, segundo nossos gostos. É Deus que no-la dá. Foi Deus que se dignou em obra de infinita misericórdia nos falar de si mesmo. A nós cabe agradecer a Deus tão imensa bondade e aderir de toda a nossa alma e de todo o nosso coração a Ele que é imutável e que nos comunicou verdades imutáveis. Não podemos mudar aquilo que nos foi dado por Cristo. Não podemos mudar o credo, não podemos mudar a doutrina da Igreja, a moral da Igreja, não podemos mudar a constituição da Igreja. Não podemos querer adaptar a Igreja ao mundo, mas devemos querer converter o mundo à Igreja.

O Papa São Pio X, de quem comemoramos o centenário de nascimento para o céu nesse ano de 2014, em sua Carta chamada Notre Charge Apostolique, dirigida aos Bispos franceses, a respeito de um movimento chamado Sillon afirmou: “os verdadeiros amigos do povo não são os revolucionários nem os inovadores, mas os tradicionalistas.”

Tradição não quer dizer, porém, imobilismo completo. A Tradição da Igreja compreende diferentes aspectos. Alguns podem mudar outros não. O depósito da fé, os ensinamentos infalíveis de fé e moral não podem ser mudados. Aquilo que foi revelado aos apóstolos por Cristo ou pelo Espírito Santo e que se transmite de geração em geração não pode ser mudado. Essa tradição chama-se tradição divina. Ela não pode ser mudada. Existe também a tradição eclesiástica, que são todas as coisas que não são intrínsecas ao depósito da fé, mas que são o patrimônio e a herança das gerações precedentes transmitidas para as gerações subsequentes pela Igreja. Na tradição eclesiástica pode haver certas mudanças. Não se exclui a aceitação de mudanças legítimas naquelas partes da tradição que podem mudar. Na medida em que uma mudança não é uma novidade, na medida em que a mudança é feita por quem tem autoridade para fazê-la, na medida em que não se rejeita a legitimidade do que veio antes e na medida em que a mudança é realmente necessária, a mudança pode ser possível e legítima. Em algumas coisas a tradição pode ser mudada em outras não. Nos aspectos em que a tradição eclesiástica pode ser mudada, a mudança deve ser baseada na própria natureza desse aspecto da tradição. Por exemplo, os ritos litúrgicos só podem ser mudados quando as mudanças são realmente orgânicas, sem rupturas, sem fabricações artificiais, e quando as mudanças servem para expressar mais perfeitamente a fé e quando a composição das orações expressa melhor a intenção da Igreja e quando as orações são tornadas, desse modo, mais eficazes (para estudo mais completo sobre o assunto, ver Topics on Tradition, do Padre Chad Ripperger). Assim, podemos citar como exemplo de mudança bem feita a introdução na idade média da elevação das espécies logo após a consagração, para expressar mais perfeitamente a fé na presença real e substancial de Cristo. Uma mudança na liturgia não pode destruir todo

o edifício litúrgico desenvolvido sabiamente ao longo dos séculos, nem amenizar a profissão de fé, diminuindo, por exemplo, os gestos que confessam a presença de Cristo na Eucaristia, diminuindo as genuflexões do padre, diminuindo o cuidado com as partículas consagradas, etc. Coisa que, infelizmente, aconteceu com a liturgia nos últimos 40 anos. Enfim, nenhuma parte da tradição deve ser mudada, exceto quando a mudança favorece realmente o crescimento na fé daqueles que são os destinatários da tradição e quando essa mudança está de acordo com a natureza daquilo que vai ser mudado. A fé é o princípio constante que deve sempre guiar qualquer mudança nesses aspectos passíveis de mudança na tradição. Se a mudança diminui a expressão da fé ou se ela diminui a fé dos membros da Igreja, não será uma mudança boa.

Diante de tal grave erro, que é o modernismo – a pior das heresias – devemos ter uma fé sólida, profunda, viva. Devemos com alegria aderir à revelação de Deus, que nos falou pelos profetas e por seu próprio Filho. Devemos ter uma fé viva, que age pela caridade, pelo amor a Deus e ao próximo. Para ter essa fé, devemos, antes de tudo, pedi-la a Deus. Devemos ter uma vida séria de oração e devemos buscar conhecer, segundo nosso estado e nossa condição, a doutrina da Igreja. Devemos também ter um amor profundo pela tradição eclesiástica, por essas coisas que se foram formando ao longo dos séculos a partir do conhecimento profundo que a Igreja tem de nossa natureza humana e da doutrina de Cristo. Como diz São Paulo: “que Cristo habite pela fé em nossos corações, para que, fundados na caridade possamos compreender a latitude e a longitude, a altura e a profundidade do amor de Cristo para conosco.”

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

[Sermão] A correção fraterna e os erros opostos

Sermão para o XV Domingo depois de Pentecostes
21 de setembro de 2014 – Padre Daniel Pinheiro

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Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria.

“Irmãos, se algum homem for surpreendido em algum delito, vós, que sois espirituais, admoestai-o com espírito de mansidão e considerando a si mesmo, para que não caia também em tentação.”

Na Epístola de hoje, caros católicos, São Paulo nos fala da correção fraterna. A correção fraterna é obra de misericórdia espiritual, é ato de caridade. Como sabemos, a caridade não é amar o outro de maneira sentimental ou simplesmente concordar com tudo o que a outra pessoa faz porque ela se sente bem ao fazê-lo. Continuar lendo

[Sermão] Os princípios não negociáveis para os católicos na política

Sermão para o XIII Domingo depois de Pentecostes
07 de setembro de 2014 – Padre Daniel Pinheiro

 

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria.

Caros católicos, hoje é dia 7 de setembro. Devemos procurar rezar de modo particular pelo nosso país.

Estamos às portas de mais uma eleição em nosso país. Surgem, então, as propostas de cada um dos candidatos, com relação aos mais variados temas. É doloroso, porém, constatar que os temas de capital importância para nosso país são deixados de lado ou rapidamente descartados sem muita discussão quando surgem. Como se fôssemos seres puramente materiais, o tema que mais ocupa o noticiário e os debates é o da economia, em uma visão reducionista do ser humano e da sociedade. A economia tem, claro, sua relevância, mas ela é bem inferior aos temas que dizem respeito aos fundamentos da nossa sociedade e que moldam o nosso país agora e no futuro.

Entre esses temas fundamentais estão os que o Papa Bento XVI havia chamado no seu pontificado de princípios não negociáveis para os católicos na política. O Papa mencionou três princípios não negociáveis, quer dizer, princípios que um católico não pode desconsiderar quando se trata de eleger um candidato, de votar. O primeiro deles é a proteção da vida inocente em todas as suas fases, desde o primeiro momento da concepção até sua morte natural. Nesse primeiro princípio, está claro que o Papa se refere ao aborto, à eutanásia e a outros assuntos conexos, como a pesquisa com células-tronco embrionárias. O aborto, como sabemos, é o assassinato do bebê ainda no ventre materno. A eutanásia é o assassinato de um doente, tirando dele os meios ordinários de sobrevivência ou matando-o simplesmente, com uma injeção ou algo do gênero. A pesquisa com células-tronco embrionárias é aquela que usa e mata os embriões, em geral fruto de inseminação artificial – inseminação artificial que é gravemente proibida pela Igreja Católica – para pesquisas nas mais diversas áreas ou simplesmente para se fazerem cosméticos. As pesquisas com células-tronco embrionárias são completamente ilícitas porque matam uma vida humana, e, além disso, têm mostrado pouquíssimos resultados. As pesquisas com células-tronco adultas, tiradas de órgãos de pessoas adultas não é ilícita e, essa sim, tem mostrado resultados. Deus faz as coisas bem feitas, caros católicos. Portanto, o primeiro ponto não negociável é a proteção da vida inocente em todas as suas fases, desde a concepção até sua morte natural.

O segundo ponto não negociável é a promoção da família natural, na verdade o único tipo de família que existe, com a união entre um só homem e uma só mulher pelo matrimônio indissolúvel. De modo particular, o católico deve defender a família diante das tentativas do reconhecimento legal de uniões de pessoa do mesmo sexo. Diz a nota doutrinal da Congregação para a Doutrina da Fé de 2003 sobre os projetos de reconhecimento legal das uniões entre pessoas homossexuais: “Em presença do reconhecimento legal das uniões homossexuais ou da equiparação legal das mesmas ao matrimónio, com acesso aos direitos próprios deste último, é um dever opor-se-lhe de modo claro e incisivo. Há que se abster de qualquer forma de cooperação formal na promulgação ou aplicação de leis tão gravemente injustas e, na medida do possível, abster-se também da cooperação material no plano da aplicação. Nesta matéria, cada qual pode reivindicar o direito à objecção de consciência.” Portanto, não se trata de se opor simplesmente ao “casamento” homossexual, mas trata-se de se opor a qualquer reconhecimento legal dessas uniões. No Brasil, um reconhecimento legal foi feito insidiosamente no Supremo Tribunal Federal e sua aplicação foi forçada pelo Conselho Nacional de Jusitça, à revelia da população majoritariamente contra.

Finalmente, o terceiro princípio não negociável mencionado por Bento XVI é o direito dos pais de educarem os filhos. A família antecede o Estado. Portanto, por direito natural cabe aos pais educar os filhos e não cabe ao Estado impor o que ele bem entende, como a ideologia do gênero ou o indiferentismo religioso, por exemplo. O Estado, com seus planos nacionais de educação, tem querido cada vez mais monopolizar a educação de nossas crianças e jovens, querendo obrigar a entrada na escola cada vez mais cedo, estendendo os horários, etc. A educação é direito e dever primeiramente dos pais, por lei natural.

Deve ser para todos evidente que uma sociedade em que os pais matam os filhos, em que os filhos matam os pais idosos, ou em que se mata uma vida inocente simplesmente para se poder viver com mais tranquilidade e sem ter tanto trabalho, é uma sociedade corrompida no seu fundamento. Uma sociedade que reconhece e legitima as uniões homossexuais, uniões que não se voltam para a perpetuação da espécie humana, uniões que não podem dar frutos, que não podem gerar vida, uniões que se opõem ao mais elementar dado da realidade, que é a complementaridade entre um homem e uma mulher – uma sociedade que reconhece e legitima essas uniões está corrompida no seu fundamento. Uma sociedade em que a família não é a principal educadora das crianças e dos jovens é também uma sociedade corrompida no seu fundamento. Pode até ser que tenha durante certo tempo uma prosperidade econômica, mas aquela prosperidade que realmente importa, que é a da virtude, já não existe. E uma sociedade corrompida moralmente a tal ponto está fadada a desaparecer e a ser castigada por Deus.

São esses os três princípios não negociáveis de que nos falava o Papa Bento XVI. É claro que os outros princípios da lei natural e da lei divina não podem ser negociados. Não se pode negociar o princípio, sempre afirmado pela Igreja, da impossibilidade de ser católico e socialista ou comunista ao mesmo tempo. Ou se é uma coisa ou outra. Não se pode negociar o princípio de que a Igreja católica é a verdadeira religião revelada por Deus e que, consequentemente, ela deva ser reconhecida como tal pelo Estado. E assim por diante. Nenhum princípio da fé, da Revelação ou da lei natural pode ser negociado. O que devemos destacar é que esses três princípios não negociáveis mencionados pelo Papa bento XVI estão realmente no fundamento de tudo, não só da sociedade civil, mas também da Igreja. Se uma sociedade cede em um desses três pontos, todo o resto automaticamente desmorona.

E esses três pontos de fundamental importância são completamente negligenciados pelos mais diversos candidatos. Os temas que realmente importam para a sociedade são silenciados, pois pode ser que a sociedade se dê conta desses gravíssimos erros e do suicídio que significam. Esses temas são silenciados porque os principais candidatos são favoráveis em maior ou menor escala a esses erros. Quando alguém ousa levantar algum desses temas e tratar deles devidamente, apontando os problemas e perigos gravíssimos, é logo tratado de fundamentalista religioso. De fundamentalismo religioso não há nada. Primeiro, são temas que dizem respeito à lei natural, independentemente da religião. Nossa razão compreende que não se pode matar um bebê, compreende que não se pode matar um doente. Nossa razão compreende que a união entre duas pessoas é em vista da procriação, da geração dos filhos. Nossa razão compreende que a família é a primeira sociedade onde se educam os filhos. E, ainda que fosse um tema estritamente religioso, é preciso dizer que a Igreja poderia afirmar e deveria reafirmar a sua doutrina, para, com a luz do Evangelho, evitar um grande mal para a sociedade.

Corremos o risco, caros católicos, de ver nosso país se afundar cada vez mais em um socialismo difuso – cada vez menos difuso e mais palpável -, em um relativismo moral ainda mais drástico e pernicioso, em um esquecimento completo da lei natural e da lei de Deus. Nós precisamos fazer a nossa parte. E nossa parte começa pelas nossas famílias, por famílias católicas, em que os filhos são bem educados, em que os membros buscam, cooperando entre si, cumprir a vontade de Deus em todas as coisas e chegar ao céu. Fazer nossa parte com famílias católica numerosas, de onde saíram bons padres, bons religiosos e religiosas. Famílias católicas de onde saíram futuros maridos e esposas católicas que terão famílias católicas numerosas, com vocações e assim por diante. É assim que faremos nossa parte para restaurar tudo em Cristo. Devemos também professar publicamente a nossa fé, sem respeito humano, nos ambientes em que vivemos e agir na esfera pública na medida de nossas possibilidades e sempre em conformidade com a doutrina católica.

Rezemos e façamos a nossa parte por nosso país, para que ele não seja como esses dez leprosos ingratos do Evangelho de hoje. As terras brasileiras receberam de Deus um grande favor, que foi a colonização feita pelos católicos portugueses, que nos trouxe a luz do Evangelho, que nos trouxe Nosso Senhor Jesus Cristo. Se renegarmos essa graça, corremos sérios riscos de cairmos em paganismo pior que o dos índios. Peçamos, nessa novena de Nossa Senhora das Dores, também pelo Brasil, e que Deus tenha piedade de nós.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

[Sermão] O Bom Samaritano

Sermão para o XII Domingo depois de Pentecostes
31 de agosto de 2014 – Diácono Tomás Parra

 

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria.

Reverendo Padre, Caros irmãos,

Neste 12º Domingo depois de Pentecostes, o Evangelho nos narra que, estando Jesus entre os doutores da lei, um deles levantou-se e disse-lhe, para tentá-lo: “Mestre, que devo eu fazer para possuir a vida eterna?”. Nosso Senhor, por sua vez, cheio de mansidão, lhe propôs também uma questão, seguindo seu custume quando era Ele mesmo testado, e disse: “Que é que está escrito na lei? Como lês tu?”. O doutor, respondendo, disse: “Amarás o Senhor teu Deus com todo teu coração, com toda a tua alma, com todas as tuas forças, com todo teu entendimento; e o teu próximo como a ti mesmo”. Nosso Senhor então, responde: “Respondeste bem; faz isso, e viverás”, como dizendo, faz isso sempre e terás a vida eterna.

“Mas quem é meu próximo?”. Esta pergunta do doutor mostra a soberba dos escribas, que acreditavam serem poucos os que mereciam seu amor. E foi também a ocasião para Cristo tomar a palavra e ensinar a parábola do Bom Samaritano, que é o quadro mais belo e mais perfeito que se poderia fazer do amor do próximo.

Nessa parábola do Evangelho, caros irmãos, Nosso Senhor descreve a Si mesmo. Ele é o Bom Samaritano que trata o homem com uma misericórdia admirável e divina. Ele é o exemplo perfeito de amor de Deus e do próximo.

Primeiramente, caros irmãos, o Bom Samaritano olha cheio de compaixão para aquele homem ferido e despojado de seus bens, e se aproxima dele. Ora, esse homem somos nós, pecadores, despojados de todas as riquezas de ordem sobrenatural por causa do pecado. Nosso Senhor se aproximou de nós pela sua Encarnação, mistério no qual ele manifesta a sua onipotência, e o tão grande amor que teve por nós, que o levou a rebaixar-se e a assumir, num ato de infinita humildade, uma natureza humana frágil, capaz de sofrer, de sofrer por nós. Ele aproximou-se, também, deste homem ferido, pela maneira que quis se apresentar ao mundo, comendo com os pobres, com os pecadores, levando uma vida humilde, e escolhendo, muitas vezes, no povo simples os seus apóstolos, aos quais devia confiar sua missão. Além disso, a cada dia, Nosso Senhor vem sobre o altar, na missa, para pagar pelos nossos pecados e nos fortalecer pela comunhão.

Tendo-se aproximado, o Bom Samaritano ligou-lhe as feridas. Eram muitas essas feridas deste homem abandonado meio morto pelos ladrões. Muitos eram os ferimentos do homem decaído pelo pecado. Na verdade, caros irmãos, depois do pecado, o homem havia perdido a graça santificante, que é a amizade com Deus, a vida sobrenatural da alma. Seu entendimento estava obscurecido para as verdades mais fundamentais da religião. Sua vontade, debilitada por ter apegado o coração à criatura e o afastado do Criador, deixando-se por isso, muitas vezes, dominar pela concupiscência; seu corpo estava submetido à doença e à morte, e suas paixões ficaram como revoltadas e seguindo sem controle a lei da concupiscência.

Mas Nosso Senhor, nosso Bom Samaritano, por amor, vai tratar e curar estes ferimentos. Na cruz, Ele nos alcança de novo a graça santificante, estabelecendo uma Nova Aliança entre Deus e os homens. Pelos seus ensinamentos, Ele iluminou nossa inteligência, ampliando a revelação divina. Ele fortaleceu nossa vontade, nos dando a esperança, que nos faz desejar as coisas do céu, e a caridade sobrenatural, que educa nossos amores segundo Deus. Com seu exemplo, ensinou-nos que a morte é uma passagem para uma vida incorruptível e bem-aventurada, e, morrendo por nós, fez das misérias desta vida meios para ganharmos méritos para a vida eterna.

Em seguida, o Bom Samaritano, deitando azeite e vinho sobre as feridas, representa Jesus Cristo, que através dos sacramentos aplica sua misericórida e seus méritos, apagando nossos pecados e nos fortalecendo pela graça para uma vida nova, uma vida santa. O azeite e o vinho são, por um lado, a doçura misturada com a severidade, com as quais Nosso Salvador nos cura, nos perdoando e nos corrigindo. Por outro lado, representam a palavra de Deus, que ao mesmo tempo revela verdades suaves que conduzem ao arrependimento e verdades terríveis que fazem o pecador temer por sua condenação.

Depois disso, caros irmãos, o Bom Samaritano coloca o homem sobre sua montada, para levá-lo. Fazendo isso, ele representa Cristo, que assumindo a natureza humana, nos elevou para perto de Deus. Pois Ele tomou sobre si nossos próprios pecados, de tal forma que pudéssemos ser incorporados a Ele para formar seu Corpo Místico. Além disso, Nosso Senhor nos eleva do chão, ou seja, nos tira de nossos vícios, oferecendo-nos um exemplo perfeito de obediência a Deus Pai, de humildade, de mansidão e de todas as virtudes. E, também, a cada dia nos auxilia em nossos trabalhos e sofrimentos, nos chamando com estas palavras: “Vinde a mim todos os que estais cansados sob o peso do vosso fardo, e eu vos aliviarei”. Este gesto de tomar nos braços o pecador significa também associá-lo à sua Cruz, à obra da Redenção.

A estalagem, para onde é levado o homem ferido, simboliza a Igreja Católica, a quem Nosso Senhor confiou todos os homens, antes de subir aos Céus; e é unicamente na Igreja Católica que eles acharão todos os auxílios próprios para curar as suas chagas, e para fazê-los obter uma saúde perfeita, a salvação.

O Bom Samaritano, que segundo o Evangelho de hoje, agiu como o próximo desse homem ferido, é figura de Cristo Nosso Senhor, que se fez homem para ser nosso próximo, e assim tudo dispôs para nossa salvação.

Tendo nos dado o exemplo deste amor ao próximo, que é, aliás, sinal e condição do amor de Deus, Cristo nos deixou o “mandamento novo”: “Amai-vos uns aos outros, assim como eu vos amei”.

Que a meditação destas verdades e o exemplo de Nosso Senhor Jesus Cristo nos façam, caros irmãos, estar atentos aos sofrimentos e necessidades de nossos próximos, nos ensine a ter compaixão e a dedicarmos, em favor deles, nosso tempo, nosso trabalho e nossas próprias pessoas, sobretudo para o bem da alma deles.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

[Sermão] O Espírito Santo e a santificação das almas

Sermão para o Domingo de Pentecostes
08 de junho de 2013 – Padre Daniel Pinheiro

 

ÁUDIO: Sermão para o Domingo de Pentecostes 08.06.2014

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…

“Enviai o Vosso Espírito e tudo será criado e renovareis a face da terra.”

Como Nosso Senhor havia prometido aos discípulos, Ele enviou, junto com o Pai, o Espírito Santo sobre os Apóstolos e Nossa Senhora no Cenáculo em Jerusalém. Na continuação do texto dos Atos dos Apóstolos que acabamos de cantar, está dito que alguns zombavam dos apóstolos dizendo que eles estariam, na verdade, cheios de vinho. Claro que essa afirmação apenas poderia vir da má fé daqueles que ouviam os apóstolos, pois não pode estar cheio de vinho aquele que faz um discurso inteligível falando das maravilhas de Deus. Nesse verdadeiro dom de línguas que receberam os apóstolos no dia de Pentecostes, cada um entendia perfeitamente em sua própria língua o que eles falavam. Todavia, se consideramos o sentido espiritual, é preciso, realmente, dizer que os apóstolos estavam cheios de vinho. Eles estavam cheios do vinho da nova lei, que veio substituir a água da antiga lei. Eles, em Pentecostes, eram os recipientes em que Nosso Senhor transformou água em vinho, como em Pentecostes. Em suma, os apóstolos estavam repletos do Espírito Santo, repletos da graça divina, repletos do amor a Deus. E é essa a principal missão do Espírito Santo: a santificação das almas, a infusão da caridade nas nossas almas. Como dissemos há três domingos, o Espírito Santo vem para convencer o mundo do pecado, da justiça e do juízo. Ele vem para ensinar toda a verdade, para nos consolar e nos fortalecer. Ele vem para glorificar Nosso Senhor. Ele vem para realizar também tudo o que está expresso nessa magnífica Sequência da Missa de hoje, que é o Veni Sancte Spiritus. Realizando tudo isso, o Espírito Santo vem, sobretudo, para nos dar o amor de Deus. Como diz São Paulo aos Romanos (V,5): “o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado.”

O Espírito Santo, como sabemos, é a terceira Pessoa da Santíssima Trindade. Se, de maneira simples, podemos dizer que o Filho é Deus que conhece a si mesmo desde toda a eternidade, podemos dizer que o Espírito Santo nada mais é do que o amor perfeito e eterno que existe entre o Pai e o Filho. Assim sendo, a obra de santificação, que é uma obra do amor de Deus para conosco, é atribuída ao Espírito Santo, embora seja realizada pelas três Pessoas da Santíssima Trindade. É, particularmente, ao Espírito Santo que pedimos que acenda em nossas almas o fogo do amor divino: “Vinde, Espírito Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do vosso amor.” A principal missão do Espírito Santo é colocar em nossas almas a caridade. As próprias peças do gregoriano da Missa de hoje nos deixam isso claro: as melodias nos elevam de tal forma a alma que nos fazem reconhecer que nosso tesouro está nas coisas do alto e, consequentemente, nos fazem reconhecer que nosso amor deve estar nas coisas do alto, em Deus.  E é esse fogo do amor divino que devemos manter aceso em nossas vidas, em nosso dia-a-dia, em meio dos afazeres quotidianos, em meio das tribulações.

Todavia, esse fogo do amor divino não é necessariamente algo sensível. A caridade, o amor a Deus está na vontade, que é uma faculdade espiritual e não sensível. O amor a Deus – Nosso Senhor deixa claro nesse importantíssimo Evangelho de hoje – consiste em guardar as suas palavras, isto é, o amor a Deus consiste em aceitar o que Deus nos fala e em colocar isso em prática. O amor a Deus é baseado na verdade e na fé. O amor a Deus não é o palpitar do coração, não é o sentir-se bem, ou o aceitar o bem e o mal indistintamente. O amor a Deus é mais estável e mais perfeito do que isso.

Para amarmos a Deus, devemos reconhecê-lo como o Sumo Bem, como aquele que é infinitamente perfeito, que governa todas as coisas com sabedoria, mesmo quando permite o mal para que do mal venha um maior bem. Devemos ver a bondade de Deus ao longo da história da humanidade, desde o tempo de Adão e Eva, passando pelos patriarcas e pelos judeus no Antigo Testamento, até a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo para nos salvar por sua morte de cruz. Devemos ver a bondade de Deus ao institutir a Igreja, os sacramentos, o sacerdócio, ao elevar o matrimônio a sacramento. Devemos ver a bondade de Deus em nossas vidas, caros católicos, como Ele quer nos levar até Ele, nos converter. Devemos ver a bondade divina mesmo nas tribulações e provações, que Deus permite para que expiemos pelas nossas culpas, para que avancemos na virtude, para que nos tornemos semelhantes a Nosso Senhor Jesus Cristo crucificado. Devemos ver a bondade de Deus também em seus mandamentos. Os mandamentos são um grande bem, eles são o caminho que o Sumo Bem nos indica para chegarmos ao céu. Deus é o Sumo Bem, mas não é um Sumo Bem inalcançável e distante. Não, Deus veio até nós pela encarnação, Ele vem até nós pelo Espírito Santo. Deus nos ama verdadeiramente com um amor de amizade, que é o amor mais perfeito que existe, pois o verdadeiro amigo não poupa esforços para buscar o verdadeiro bem do amigo. Deus fez tudo para nos salvar, ao ponto de entregar seu próprio Filho e de enviar o Espírito Santo. Devemos amar a Deus porque é ele a nossa felicidade. A felicidade de cada ser está em agir em conformidade com a sua natureza. Nós somos seres racionais, dotados de inteligência e vontade. Nossa felicidade está em conhecer a verdade com a nossa inteligência e em amar o bem com a nossa vontade. Deus é A VERDADE e O BEM. Nossa felicidade é, então, conhecer Deus e amá-lo. E Deus, na sua bondade, nos eleva a uma felicidade muito superior à felicidade que, naturalmente, poderíamos desejar: Ele faz com que o conheçamos como Ele mesmo se conhece e Ele faz com que o amemos como filhos e como amigos. Ele quer, para nós, uma felicidade sobrenatural. Como não amar a Santíssima Trindade, caros católicos?

Muitas vezes, em nosso quotidiano, nos esquecemos de elevar os olhos ao céu e de considerar a bondade infinita de Deus e de renovar o nosso amor por Deus com um ato de caridade, com ato em que reafirmamos nosso firme propósito de amá-lo sobre todas as coisas, fazendo a vontade dEle e não a nossa. O Espírito Santo vem para acender em nossas almas esse amor, essa disposição inteira, sem reservas, de servir a Deus, de guardar as suas palavras, de fazer a vontade dEle. E é a caridade, entendida corretamente dessa forma, que vai renovar a face da terra. Ao renovar as almas pela caridade, e enterrando o velho homem pecador, é toda a face da terra que começa a ser renovada. No dia de Pentecostes, eram poucos os discípulos de Cristo. Mas era grande a caridade, que levou os apóstolos a propagarem a doutrina de Cristo até os confins da terra. Já no primeiro dia, três mil são batizados. Essa caridade dos primeiros discípulos vai tornar o mundo cristão, caros católicos, pelos martírios, pelo combate incessante contra as forças do demônio e do mundo, pela pregação fiel do ensinamento de Cristo, pela heroicidade de todas as virtudes.

O Espírito Santo não veio nos trazer, em primeiro lugar, dons extraordinários, como o dom de línguas, o dom de cura e outros. Tudo isso é bem secundário. Tudo isso não santifica a pessoa que os possui, mas se ordena para o bem do próximo.  Como dizem os autores espirituais clássicos. O Padre Royo Marín diz que “seria temerário desejar ou pedir a Deus essas graças gratis datae, uma vez que não são necessárias nem para a salvação nem para a santificação, e requerem – muitas delas ao menos – uma intervenção milagrosa de Deus. Vale mais um pequeno ato de amor a Deus que ressuscitar um morto.” (Royo Marín, Teologia de la Perfección Cristiana, p. 888). O Padre Jordan Aumann diz também que “uma pessoa pode ficar sob o poder do demônio em razão de um desejo descontrolado de experimentar fenômenos místicos extraordinários ou graças carismáticas.” (Jordan Aumann, Spiritual Theology, p. 411). Em outra ocasião trataremos mais propriamente da questão dos dons carismáticos e de como são muito mal compreendidos hoje pelos movimentos que pretendem possuí-los. Consideremos simplesmente o que foi dito: mais vale um pequeno ato de caridade do que ressuscitar um morto.

Nós devemos invocar com maior frequência, caros católicos, e de joelhos, como fizemos no Aleluia da Missa de hoje, o Espírito Santo. Muitas vezes, o Espírito Santo é o grande esquecido na nossa vida espiritual. Invocando o Espírito Santo, pedindo para que Ele acenda em nossas almas o amor divino e cooperando com as graças que Ele nos dá, poderemos avançar na caridade e, avançando na caridade, poderemos avançar em todas as outras virtudes, poderemos fazer com perfeição todas as tarefas mais ordinárias de nossas vidas, poderemos viver bem o nosso estado de vida, seja no matrimônio, seja no trabalho, em qualquer situação. Vale mais uma ação quotidiana feita com imensa caridade, quer dizer por amor profundo a Deus, do que uma grande ação feita com uma caridade morna. Sem a caridade, nada tem valor. Agora, não uma caridade vaga, mas uma caridade que supõe a fé e que supõe a obediência aos mandamentos divinos. Não esqueçamos que estamos aqui nessa terra para amar o Sumo Bem, guardando as suas palavras.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

[Sermão] A fé e as obras

IMPORTANTE: Ver abaixo a programação para os próximos sábado e domingo

 

Sermão para o V Domingo depois da Páscoa
25 de maio de 2014 – Padre Daniel Pinheiro

ÁUDIO: Sermão para 5º Domingo depois da Páscoa 25.05.2014

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria…

“Irmãos, sede realizadores da palavra e não vos contenteis apenas de a ouvir, iludindo-vos a vós mesmos.”

Essa frase da Epístola de São Thiago nos traz um ponto essencial de nossa religião católica. Não basta ouvir a Palavra de Deus, que nos foi dada por Cristo. É preciso realizar o que Cristo nos ensinou. A mesma doutrina está contida na coleta, em que pedimos a Deus não só o bem de pensar no que é reto, mas pedimos igualmente o bem de poder realizar o que é reto. Em outras palavras, caros católicos, não basta ter a fé, que nos vem pelos ouvidos, não basta acreditar. Continuar lendo

[Sermão] O que faz na terra o Espírito Santo?

Sermão para o IV Domingo depois da Páscoa
18 de maio de 2014 – Padre Daniel Pinheiro

 

ÁUDIO: Sermão para o 4º Domingo depois da Páscoa 18.05.2014

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria…

“Quando vier, porém, o Espírito de verdade, ele vos ensinará toda a verdade.”

Caros católicos, a liturgia da Santa Igreja começa já a nos preparar para a Ascensão de Nosso Senhor. E, juntamente com a Ascensão de Nosso Senhor, ela nos prepara também para a Festa de Pentecostes. Quando Cristo diz que deve voltar ao Pai, que o enviou, a alma dos discípulos fica repleta de tristeza. Ele promete, então, enviar o Espírito Santo, o Consolador, e diz o que o Espírito Santo fará. E não está dito que o Espírito Santo virá primeiramente para dar os dons carismáticos. Não, a essência da vinda do Espírito Santo, não é o dom de línguas, nem o dom de cura ou outro dom extraordinário. O Espírito Santo tem sua vinda partilhada em três aspectos: quanto ao mundo, quanto a nós e quanto a Nosso Senhor Jesus Cristo.

Quanto ao mundo, o Espírito Santo vem convencê-lo do pecado, da justiça e do juízo. O Espírito Santo vem reprovar ao mundo todos os seus pecados, sobretudo o da incredulidade, da falta de fé naquilo que NS ensinou. O Espírito Santo condena a incredulidade pela sua ação na história, em particular pela história da Igreja. Vendo como a Igreja se desenvolveu, desde os apóstolos até hoje, guardando intactos os ensinamentos de Cristo, apesar de todas as perseguições violentas e de todas as heresias, podemos constatar a verdade dos ensinamentos de NSJC. Tantos motivos para crer em Nosso Senhor e na sua Igreja, mas os homens preferem crer irracionalmente em mestres criados por eles mesmos, ou preferem acreditar na própria vontade. O Espírito Santo reprova ao mundo também os outros pecados, toda classe de pecados, servindo-se, para tanto, da pregação dos apóstolos e dos sucessores deles, servindo-se da fortaleza heroica dos mártires, da ciência dos doutores da Igreja, do exemplo dos santos. Muitas vezes, o Espírito Santo reprova ao mundo o pecado, servindo-se de castigos, como, por exemplo, a destruição de Jerusalém pelo imperador Tito no ano 70, ou pela tomada de Constantinopla pelos maometanos em 1453, ou ainda pela infiltração de algum erro entre os católicos.

Quanto ao mundo também, o Espírito Santo vem convencê-lo da justiça. Nosso Senhor foi basicamente acusado de duas coisas: de ser um pecador, e de ter blasfemado ao declarar-se Deus, afirmando ser verdadeiramente Filho de Deus. O Espírito Santo vem para estabelecer a santidade de Nosso Senhor Jesus Cristo e a sua divindade. E isso já desde Pentecostes, em que São Pedro, pela sua pregação, restabelece a justiça e a verdade quanto a Nosso Senhor Jesus Cristo. E são esses os dois pilares da pregação da Igreja: a santidade de Cristo e a sua divindade. O Espírito Santo mostra, pelos santos, como aquele que se assemelha e imita Nosso Senhor se torna verdadeiramente bom. O Espírito Santo mostra ao longo da história, como uma sociedade que se baseia em Nosso Senhor Jesus Cristo e nos preceitos de sua Igreja floresce em todos os aspectos, mas sobretudo na virtude, onde se encontra o bem do homem. Ele mostra como uma sociedade que não se baseia em Cristo tende ao caos. Portanto, o Espírito Santo reprova ao mundo sua injustiça e mostra a esse mesmo mundo a santidade e a divindade de Nosso Senhor. Nosso Senhor está hoje no lugar que lhe é devido em justiça: a direita do Pai.

Ainda quanto ao mundo, o Espírito Santo o convencerá do juízo, isto é, da condenação do príncipe do mundo, o demônio. Pela morte na cruz e pela ressurreição de NS, o demônio foi derrotado. Qualquer alma, unindo-se a Cristo pela fé e caridade, pode derrotar o demônio e o pecado. O Espírito Santo vem para nos mostrar que a vitória está com Cristo e com seus seguidores, para mostrar que Cristo venceu o mundo. Ele vem para mostrar que o demônio e o pecado já estão condenados.

Quanto aos homens, o Espírito Santo vem para ensinar toda a verdade, para consolar e para fortalecer. Ele vem para ensinar toda a verdade. Toda a verdade foi revelada pelo Espírito Santo aos Apóstolos. A Revelação termina com o último apóstolo, que foi São João Evangelista. A Igreja não foi instituída para inventar ou ensinar novidades, mas para defender, guardar, explicitar e propagar as verdades Reveladas por Cristo e pelo Espírito Santo aos apóstolos. O Espírito Santo, com sua assistência, assegura a fidelidade da Igreja à verdade revelada, garantindo assim que o ensinamento de Cristo chegue até o final dos tempos. Foi o Espírito Santo que deu a coragem e o zelo missionário aos apóstolos em Pentecostes, para que eles propagassem a boa-nova do Evangelho até os confins da terra. O Espírito Santo nos ensina a verdade iluminando as nossas inteligências, para que possamos conhecer e aderir às verdades reveladas por Cristo e por Ele.

Também quanto aos homens, o Espírito Santo vem para consolá-los. Ele vem sustentar os justos nas provações da vida cristã, para ajudá-los nas desgraças. Ele vem para nos fazer ver Jesus e a alegria no meio das cruzes. Ele vem para nos encorajar no bom caminho, neste vale de lágrimas em que vivemos. O Espírito Santo vem para nos unir em tudo a Nosso Senhor Jesus Cristo. E Ele vem consolar não só os pecadores, mas também os justos, ferindo-os com o remorso, estimulando-os ao arrependimento, fazendo-os ver que o perdão dos pecados e a conversão da vida é perfeitamente possível.

Ainda quanto aos homens, o Espírito Santo vem fortalecê-los, para que possam resistir a todas as adversidades desse mundo que já podemos chamar, com toda exatidão, de completamente pagão. Os ataques do demônio e dos outros espíritos malignos que vagueiam pelo mundo para perder as almas são inúmeros. Nesse combate, contra esse ambiente anticatólico em que as pessoas vivem totalmente esquecidas de Deus e entregues por completo às coisas da terra, é necessária essa fortaleza dada pelo Espírito Santo. Precisamos dessa fortaleza para resistir às falsas máximas do mundo : “Deus é bom e compreensivo, não vai nos condenar por nos divertirmos um pouco; comer bem, vestir-se segundo a moda, divertir-se muito, é isso que se deve procurar; o principal é a saúde e uma vida longa” e assim por diante. Precisamos do Espírito Santo para resistir às zombarias e perseguições do mundo contra a vida de piedade, contra os vestidos honestos e decentes, contra a delicadeza de consciência na profissão e em todas as ações. Precisamos dessa fortaleza dada pelo Espírito Santo para resistir às zombarias contra as leis santas do matrimônio, leis que o mundo julga antiquadas ou impossíveis de serem praticadas, leis que o mundo subverte completamente. É preciso dessa fortaleza para resistir aos escândalos e maus exemplos praticamente onipresentes, bastando sair às ruas para vê-los, ou abrir um jornal, ou mesmo escutar uma conversa por acaso… Precisamos dessa fortaleza para resistir às diversões cada vez mais abundantes e refinadas e imorais: teatros, músicas, filmes, danças, praias, piscinas, jornais, revistas, modas indecentes, conversas torpes, piadas provocadoras, frases de duplo sentido. O mundo parece nos indicar que para se divertir é preciso pecar. Tal força dada pelo Espírito Santo nos vem primeiramente e principalmente do sacramento da crisma.

Finalmente, com relação a Nosso Senhor Jesus Cristo, o Espírito Santo vem para glorificá-lo. Jesus, com sua vinda à terra, glorificou Deus Pai, com sua obediência, com sua doutrina com seus milagres. Deus Filho glorificou o Pai, dando testemunho do Pai. Deus Espírito Santo vem para que Deus Filho seja glorificado, isto é, para que Nosso Senhor seja conhecido, amado e servido. O Espírito Santo assistindo a Igreja, propagou por toda a terra a verdade sobre Deus e sobre seu amor por nós.

Que grande graça é para nós a vinda do Espírito Santo, afastando-nos do pecado, da injustiça, do juízo de condenação e levando-nos a Jesus Cristo ao nos ensinar a verdade, ao nos consolar e nos fortalecer.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

[Sermão] Todo bem vem pelos sacerdotes: a solução para a crise

Sermão para o Segundo Domingo depois da Páscoa
04 de maio de 2014 – Padre Daniel Pinheiro

ÁUDIO: Sermão para o Domingo do Bom Pastor (2º Domingo depois da Páscoa)

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria…

“Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas.”

Caros Católicos, no Evangelho de hoje, Nosso Senhor se dá o título de Pastor e de Bom Pastor. Nosso Senhor é o pastor que conhece perfeitamente suas ovelhas, que guia seu rebanho, que vai à frente de suas ovelhas, que guarda e defende suas ovelhas, que as alimenta e que dá a vida por elas. Onde já se ouviu falar do pastor que dá a vida pelas suas pobres ovelhas? Somente Nosso Senhor Jesus Cristo é tão bom Pastor ao ponto de dar a vida pelas suas ovelhas, pecadoras. Que grande a bondade e a misericórdia divinas ao nos dar um Pastor como Nosso Senhor. E Nosso Senhor foi venerado como o Bom Pastor desde o início, desde o tempo dos primeiros cristãos. Já São Pedro, no final da Epístola de hoje, menciona Cristo como Pastor. Nas catacumbas em Roma, onde os cristãos muitas vezes se reuniam para o culto e para venerar os mártires lá sepultadosdos, encontramos pinturas de Jesus, o Bom Pastor.

Nosso Senhor, o nosso pastor eterno, subiu aos céus, que é o seu lugar próprio após a ressurreição, com seu corpo glorioso. Antes de subir aos céus, porém, na Quinta-Feira Santa, durante a Última Ceia – a primeira Missa -, Nosso Senhor nos deixou pastores, seus representantes na terra, para guiarem os homens ao pasto eterno do céu. Ele instituiu o sacerdócio. Nosso Senhor fundou a sua Igreja, a Igreja Católica Apostólica Romana, como uma sociedade hierárquica, com o Papa como chefe supremo, com os bispos, responsáveis por uma parte do rebanho, sempre em dependência do papa, e com os padres, que cooperam com os bispos. Nosso Senhor, na sua bondade infinita, instituiu o sacerdócio, Ele instituiu o sacramento da ordem, Ele instituiu pastores para as suas ovelhas.

São Bernardo nos diz que todas as graças nos vem pelas mãos de Maria. E não só ele, mas vários santos e a própria Igreja. Podemos dizer também, repetindo as palavras do Santo Cura d’Ars, que tudo nos vem também pelas mãos do sacerdote. Todas as graças, todos os dons celestiais. É muito conhecida a passagem da Sagrada Escritura em que o profeta diz que todos os males vêm dos maus sacerdotes. Mas o contrário também é verdade: todos os bens vêm pelas mãos dos sacerdotes. É pelas mãos do padre que o sacrifício de Cristo na Cruz é renovado sobre os altares durante a Missa. E é pela Missa que os méritos de Cristo nos são aplicados. É pelas mãos do padre que Nosso Senhor desce do céu em corpo, sangue, alma e divindade sob as aparências do pão e do vinho. Nem Nossa Senhora nem os anjos podem fazer tal coisa. Quem deu a vida da graça para a nossa alma pelo batismo, tirando-a do pecado original? Ordinariamente, o Padre. Quem purifica a nossa alma dos seus pecados atuais? O Padre, pela confissão. Quem alimenta nossa alma, dando-lhe o Corpo de Cristo? O padre. Quem prepara a nossa alma para a morte pela extrema-unção, fortalecendo-nos para o último combate no momento da morte? O Padre. Quem nos presta o auxílio das bênçãos e dos sacramentais, para podermos viver bem em bons cristãos? O Padre. Quem tem o dever de nos instruir naquilo que Nosso Senhor veio nos transmitir e nos revelar? O Padre. Em última instância, caros católicos, como nos diz o Santo Cura d’Ars, todas as graças vêm ao mundo pelo sacerdote.

O padre se torna tal ao receber o sacramento da ordem. O sacramento da ordem, como o próprio nome sugere, ordena o padre inteiramente para o próximo e para Deus. O sacerdote não é sacerdote para si mesmo, mas para os outros e para Deus. O sacerdote não pode confessar a si mesmo, ele não pode administrar a si mesmo os sacramentos, com exceção da eucaristia. O sacerdócio é inteiramente para Deus e para o bem das almas. Que grande graça Nosso Senhor nos deu com o sacerdócio. O sacerdócio católico é participação no sacerdócio de Cristo. E o que Nosso Salvador veio fazer no mundo? Dar testemunho do pai e nos salvar. O mesmo deve fazer o sacerdote: fazer que Deus seja mais conhecido, amado e servido, e deve trabalhar para a salvação as almas.

Se é tão grande e importante o sacerdócio, é imperioso que haja padres e bom padres. Ainda para citar São João Maria Vianney, se uma região é deixada 20 anos sem padre, as pessoas irão adorar os animais. O mesmo se pode dizer no caso em que o pastor, em vez de ser um bom pastor, é um mercenário, preocupado com seu próprio bem e conforto, preocupado em propagar suas próprias ideias ou em agradar ao mundo, em vez de se preocupar coma a glória de Deus e com a salvação das almas. O mesmo santo nos diz que quando se quer destruir a religião, se começa por atacar o sacerdote, pois sem o sacerdote não há mais sacrifício e, se não tem mais sacrifício, não tem mais religião. Ataca-se o sacerdócio porque é dele que vem todo o bem, pelo sacrifício, pelos sacramentos, pela recitação do ofício divino e por tantos outros meios. O demônio, porém, sabe que não pode destruir o sacerdócio católico, pois Nosso Senhor nos assegurou que as portas do inferno não haveriam de prevalecer. Sabendo que não pode destruir o sacerdócio católico enquanto tal, o inimigo tenta desvirtuar o exercício desse sacerdócio, de forma que o sacerdote já não seja mais o homem do sacrifício da Missa e do culto a Deus, de forma que o sacerdote se preocupe mais com os aspectos sociais do que com o bem das almas, de forma que o sacerdote se torne um filantropo mais do que um pastor, de forma que o sacerdote busque os seus interesses e não os de Deus e o da salvação das almas. Infelizmente, esse desvirtuamento do sacerdócio católico está bem presente atualmente. Se nossa sociedade vive na grande confusão atual, é, em grandíssima parte, devido à crise que há no sacerdócio. Ainda não chegamos talvez a adorar os animais, todavia, já temos o aborto e a união homossexual e tantas outras coisas que destroem o próprio fundamento da sociedade. O sacerdote tem que ser o homem da Missa, o homem do Sacrifício, o homem da eucaristia. Ele tem que ser o homem da fidelidade aos ensinamentos de Cristo. Ele tem que ser o pastor que aponta e denuncia o lobo. Ele tem que ser o homem que aponta para o céu, que nos faz lembrar que fomos criados para o céu, para a vida eterna para Deus. Ele tem que ser o homem que reflete a caridade do Coração de Jesus, conduzindo com bondade e firmeza as pessoas para a glória eterna.

É dever de todos nós, caros católicos, contido no 4º mandamento, rezar pelos pastores da Igreja. Rezemos a Deus pelo Papa, pelos Bispos, pelos sacerdotes. Peçamos a Deus pelas vocações sacerdotais e para que Ele nos dê sacerdotes santos. Não há outra solução para a crise a não ser famílias santas, para que dessas famílias possam sair sacerdotes santos, para que possam converter as almas. Façamos, então, a nossa parte, sendo bons cristãos, pois Deus dá ao povo os pastores que o povo merece. Nosso Senhor é o Bom Pastor, que dá a vida pelas suas ovelhas. Se rezarmos, pedindo-Lhe que nos dê pastores segundo o seu Coração e nos esforçamos para viver em bons cristãos, Ele há de ouvir as nossas preces.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.