Não se deve desejar satisfações e visões espirituais!

 

Tome cada dia a sua cruz e siga-me

O Diálogo” de Santa Carina de Sena

18.3.2 – Desapego das consolações

 Deve o cristão entusiasmar-se varonilmente pela oração, que é uma verdadeira mãe. Isto acontece quando ele se fecha na cela do autoconhecimento, depois de atingir o amor-amizade e amor filial. Quem não percorre tais etapas, permanecerá sempre na tibieza e na imperfeição, amando a mim (Deus, é Ele quem fala à Santa Catarina.) e ao próximo por interesses pessoais, na procura de consolações. Sobre tal amor imperfeito quero discorrer agora, sem ocultar-te uma ilusão proveniente desse apego às consolações.

Desejo que saibas: o servidor que me ama na imperfeição procura mais as consolações sensíveis que se a minha divindade. É a atitude da pessoa que se perturba, quando desaparecem o prazer espiritual e a tranqüilidade de vida. Muitos vivem virtuosamente enquanto estão na prosperidade; desorientam-se na prática da virtude se lhes mando alguma dificuldade. Quando alguém lhes pergunta: “Por que estás perturbado?”, respondem: “Porque estou em tal ou tal contrariedade; parece-me que estou perdendo o pouco de bem que faço. Já não aquele entusiasmo e aquele amor de antes, por causa desta dificuldade. Acho que, na tranqüilidade anterior, tirava mais proveito do que agora”.

Enganam-se tais pessoas relativamente àquela “tranqüilidade anterior”. Não é a contrariedade que lhes traz menor amor e menor dedicação. Em si mesmas, as ações possuem idêntico valor na aridez de espírito e no fervor. Aliás, com a aridez as ações podem até valer mais, se as pessoas tivessem paciência. Mas elas se perturbam, pelo fato que antes sentiam maior prazer. Na realidade, antes me amavam pouco e viviam com a consciência tranqüila na prática de pequenas boas obras. Retirado o ponto de apoio, crêem ter perdido o sossego do próprio agir. Com tais pessoas acontece como ao jardineiro, satisfeito no seu trabalho por causa do prazer que sente. Labutar no jardim parece-lhe um descanso; estar no meio das flores, uma satisfação. De fato, ele se alegra mais com as flores do que com o trabalho. Se lhe retirarem as flores, o prazer acabará. Também aquelas pessoas! Se sua principal alegria se concentrasse na prática do bem, não cairiam na perturbação. Alegrar-se-iam até, pois quem realmente deseja uma coisa jamais poderá ser impedido de realizá-la; mesmo que a privem da satisfação que acompanha sua atividade, como no caso das flores. Enganam-se essas almas colocando o alicerce de suas atividades nas consolações, pois dizem: “Antes de entrar nesta aridez, eu agia melhor e com mais prazer; a prática do bem me ajudava. Agora já não me favorece, não sinto mais gosto”.

 É errado tal modo de pensar e falar. Nada diminuiria em tais almas, se elas se comprazessem no agir virtuosamente por causa da virtude em si; até acrescentariam seus esforços. Na realidade agem por egoísmo e então tudo se acaba. Tal é o engano em que caem muitos na vida virtuosa, proveniente das consolações sensíveis.

Costumo recompensar toda boa ação e com maior ou menor liberalidade conforme a medida do amor de quem a pratica; por isso, concedo consolações espirituais aos meus servidores imperfeitos, durante a oração. Ajo de tal forma, não para que apreciem tais satisfações erroneamente, isto é, atribuindo maior valor ao dom que ao doador, que sou eu. Meu desejo é que tomem consciência do meu amor e da própria indignidade, deixando o prazer em segundo plano. O engano consistirá em agir diversamente.

18.3.2.1 – A rotina das consolações

Um primero engano consiste na procura de determinada satisfação espiritual para nela se comprazer. Tendo-a experimentado antes, a pessoa começa a agir sempre do mesmo jeito para obter idêntico prazer (Será mera coincidência com os ditos “batismos no espírito”?). Na verdade, eu não sigo sempre as mesmas estradas, como se fosse coagido a dar consolações e gostos. Concedo-as diversificadamente segundo meu beneplácito e as necessidades humanas. Mas há gente sem discernimento, que continua a procurar a consolação naquele modo, com a pretensão de impor leis ao Espírito Santo. Atitude errada! Deveriam, isto sim, caminhar varonilmente pela ponte-mensagem de Cristo Crucificado, aguardando os dons na modalidade, tempo e lugar que eu quisesse enviar. Se nada concedo, faço tal coisa por amor, nunca por maldade. Quero que os homens me procurem por mim mesmo, não por motivo das consolações que propicio; quero que acolham humildemente meu amor, sem pensar muito nas satisfações. A atitude contrária produz sofrimento e perturbação no momento em que faltar a consolação, objeto de tanta preocupação. Tais pessoas querem conforto sob medida; tendo experimentado um prazer espiritual, pretendem repetir a mesma sensação. Alguns são de tal modo ignorantes que, se os visito de um modo diferente, recusam-me! Somente aceitam aquela modalidade costumeira. É um defeito inerente à própria paixão e deleite espiritual em si; é uma ilusão, pois como não pode alguém deter-se num único método, mas haverá de progredir na virtude ou voltar ou voltar atrás, assim não pode o espírito fixar-se num determinado gozo espiritual por mim concedido, como se minha bondade não pudesse dar outro.

Concedo consolações de diversas maneiras: uma vez será contentamento; outra vez arrependimento que agita interiormente; vezes há que me torno presente na alma sem que ela o perceba, pois faço estar no espírito a pessoa de meu Filho em vários modos: ora sentirá na profundidade da alma grandíssimo prazer, ora nem o perceberá, como se poderia esperar. Realizo todas estas coisas por amor; quero que o homem progrida na humildade, na perseverança; quero ensinar-lhe a não ditar regras (ao Espírito Santo), a não considerar as consolações como uma finalidade (conheço pessoas que vão aos grupos de oração e às “missas de cura e libertação” durante a semana, porém, não costumam ir à Missa aos domingos!). Quero que alicerce em mim sua virtude; que aceite os acontecimentos e meus dons com humildade. Quero que acreditem no seguinte: que concedo as consolações espirituais de acordo com as necessidades da sua santificação e aperfeiçoamento.

18.3.2.2 – O egoísmo espiritual (4º, 5º e 6º parágrafos)

Outro tipo de egoísmo existe, semelhante (ao tratado no parágrafo anterior!), que pode causar prejuízos ainda maiores. Costumo dar a meus servidores gáudio espiritual e visões. Se alguém unicamente se preocupar na obtenção de tais favores, acabará por cair na amargura e no tédio no momento que notar sua ausência progressiva; cada vez que eu não os der, julgarão que perderam a graça. Já afirmei (18.1.2) que costumo visitar e ausentar-me do homem no tocante às consolações – sem prejuízo do estado de graça – a fim de levar a pessoa à perfeição. Em tais circunstâncias, muitos mergulham na tristeza e sentem-se num inferno, substituído pelo tormento das tentações.

Ninguém deveria ser tão ignorante assim, deixando-se ludibriar pelo egoísmo sem compreender a realidade. É preciso discernir quando estou presente, compreender que sou o sumo bem, aquele que dá a boa vontade no tempo das batalhas! Que não se fique correndo atrás de consolações! Humilhe-se o homem, considere-se indigno de viver no sossego e quietude de espírito. Alias, é por isso que me afasto. Desejo que a pessoa seja humilde, que tenha consciência da minha caridade, que note a retidão interior que lhe concedo na hora da dificuldade. Quero que beba o leite (consolo) espiritual não somente por borrifos na face da alma, mas sugando diretamente no coração de meu Filho. Juntamente com tal leite, quero que coma a sua carne; que procure consolações no corpo do crucificado, vivendo sua mensagem, que transformei numa ponte que vos conduza até mim.

Eis as razões por que me afasto durante a aridez do espírito. Se os homens caminharem com prudência, não parando estupidamente na procura de consolações, retornarei depois com imensa delícia, força, luz, ardor de caridade. Os que sentirem rebeldia e tristeza pela ausência de consolações, pouco aproveitarão e continuarão em sua tibieza.

18.3.2.3 – O diabo em figura de luz (1º e 2º parágrafos)

Pode acontecer ainda que alguém caia num quarto engano, quando o demônio se apresenta em forma de luz. Costuma ele tentar os homens de acordo com as disposições espirituais que neles encontra. Por tal motivo, ninguém deve desejar satisfações e visões espirituais; aspire-se somente pela virtude. Na humildade, cada um se julgue indigno de tais coisas; se as receber, comporte-se segundo a caridade. O diabo é capaz de mostrar-se numa figura de luz, por vários modos, na alma de quem gulosamente sonha com visões. Umas vezes toma a figura de um anjo, outras vezes a semelhança do meu Filho, outras ainda como se fosse um dos meus santos. Dessa maneira ele usa o anzol do prazer espiritual para atrair a alma, para prendê-la em suas mãos. A única solução, em tais casos, é a humildade, pois o diabo não tolera o homem humilde. Somente a humilde renúncia a qualquer satisfação pessoal evitará que o diabo retenha a alma. Assim mesmo, tal renúncia deve estar acompanhada do amor; não do amor pelo dom, mas pelo doador, que sou eu.

Se me perguntares me perguntares: “Qual o sinal que nos indica que a “visita” é do diabo e não tua?”, respondo: “Se for o demônio em forma de luz, sua presença inicialmente produzirá alegria, mas pouco a pouco ela irá desaparecendo, até transformar-se em tédio, trevas e remorso de consciência. Ao contrário, se for uma visita minha, no começo a pessoa sentirá temor, um temor santo que depois lhe dará alegria, segurança e uma feliz prudência que, refletindo, não duvida. Dir-se-á: “Não sou digno de receber tua visita; como pode ela acontecer?” e projeta-se na imensidade do meu amor, ciente do bem que lhe posso fazer. Não tomo em consideração a indignidade humana, mas minha bondade. É esta que, pela graça e demais favores, torna o homem apto a receber-me. Não desprezo a afeição com que ele me invoco. Acolhendo-me, diz a alma: “Eis a tua serva; faça-se a tua vontade” (Lc 1, 38), e ao encerrar a oração em que a visitei, conservará alegria e jubilo espiritual; por humildade sentir-se-á indigna, mas com amor reconhecerá minha presença.

Os destaques são nossos, MissaTridentinaemBrasília.

2 respostas em “Não se deve desejar satisfações e visões espirituais!

  1. There’s nothing to thank.

    Pray for us!

    Cleber

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