Sermão para a Solene Festa da Imaculada Conceição de Maria Santíssima
8 de dezembro de 2012 – Padre Daniel Pinheiro
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria. […]
Hoje é um dia de imensa alegria, caros católicos, dia de imensa alegria espiritual. Gaudens gaudebo. É com essas palavras de grande júbilo que a Santa Igreja começa a Missa de hoje. O Intróito da Missa sempre nos indica o estado de alma particular que devemos ter para assistir à Missa do dia. As primeiras palavras são as mais importantes. Gaudens gaudebo in Domino. Alegrando-me alegrar-me-ei no Senhor. A causa dessa imensa alegria espiritual é múltipla.
Nossa Senhora, concebida sem pecado, é a Estrela da manhã, nos diz a Ladainha da Santíssima Virgem. A estrela da manhã é mensageira infalível da aurora, da vinda do sol e indica o fim da noite. Quando a estrela da manhã se levanta no horizonte e sua luz brilha, já sabemos que o dia se aproxima.
É hoje o dia em que a estrela da manhã se levanta no horizonte.
É hoje, com a Imaculada Conceição de Nossa Senhora.
Hoje, Maria Santíssima foi formada no ventre de Santa Ana, preservada do pecado original. A Imaculada Conceição anuncia a vinda próxima do Salvador.
O Dogma da Imaculada Conceição foi proclamado pelo Bem-Aventurado Papa Pio IX em 1854. Eis as palavras do Santo Padre:
Pio IX definiu o dogma na Encíclica Ineffabilis Deus.
“[…] Com a autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos bem-aventurados Apóstolos Pedro e Paulo, e com a Nossa, declaramos, pronunciamos e definimos que a doutrina que sustenta que a beatíssima Virgem Maria, no primeiro instante da sua Conceição, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, Salvador do gênero humano, foi preservada imune de toda mancha de pecado original, foi revelada por Deus, e, por isso, deve ser crida firme e inviolavelmente por todos os fiéis.”
Assim, trata-se de uma verdade revelada proposta como tal pela Santa Igreja. Aquele que a nega, duvida ou a questiona naufraga na fé e já não pode agradar a Deus, pois sem fé é impossível agradar a Deus, como nos diz São Paulo (Heb XI, 6).
Como todos sabemos, a Imaculada Conceição não é invenção do séc. XIX. Basta conhecer um pouco de história para ver quantas imagens da Imaculada Conceição anteriores a esse século existem. Mas muito mais do que isso.
A Imaculada Conceição está na profecia do Gênesis, que nos diz que uma mulher e sua raça será inimiga da serpente. Essa inimizade é tal que Nossa Senhora nunca esteve sob o domínio da serpente pelo pecado. E com sua descendência a mulher esmagará a cabeça da serpente.
A Imaculada Conceição está no Véu ou Velo de Gedeão: quando tudo ao redor recebeu o orvalho, o véu permaneceu seco. Quando tudo ao redor ficou seco, Nossa Senhora recebeu o orvalho.
A Imaculada Conceição está em Ester, dispensada da lei que mandava matar toda pessoa que aparecesse na presença do Rei sem ser anunciada. Ester apareceu diante do rei sem ser anunciada e não foi punida. Nossa senhora apareceu no mundo e não foi punida pelo pecado original.
A Imaculada Conceição está no anúncio do Anjo: Ave, CHEIA de graça.
A Imaculada Conceição está na “Mulher”, do décimo segundo capítulo do Apocalipse; revestida de sol, com doze estrelas ao redor, com a lua aos seus pés, vitoriosa sobre o dragão.
Poderíamos citar ainda outras passagens…
Vale destacar, porém, como o faz Pio IX, que a Imaculada Conceição não exclui Nossa Senhora da obra da redenção realizada por Nosso Senhor Jesus Cristo. Só nEle pode ser encontrada a salvação. Maria Santíssima, como filha de Adão, deveria ter sido concebida com o pecado original. E se Ela foi preservada, foi preservada em virtude dos méritos futuros de Cristo. Nossa Senhora é, portanto, redimida, mas redimida de uma forma mais perfeita que os outros homens. Ela é redimida de uma maneira que convém à Mãe de Deus.
É possível salvar alguém da lama de uma poça de duas formas: ou impedindo que a pessoa caia na poça ou lavando a pessoa depois de ela ter caído na poça e se enlameado. Deus pode salvar da lama do pecado dessas duas formas. Claro que salvar uma alma preservando-a da lama do pecado é muito mais perfeito e melhor. Esse modo perfeito e mais pleno de redenção convinha unicamente à Mãe de Deus.
A Imaculada Conceição convém unicamente à Maria Santíssima e a mais ninguém. A Imaculada conceição é tão própria a Nossa Senhora que se tornou nome próprio. Nossa Senhora em Lourdes se apresenta à Santa Bernadette dizendo: Eu sou a Imaculada Conceição. Os pastores e os fiéis já muito antes de Lourdes chamavam Nossa Senhora de “a Imaculada Conceição”, ou simplesmente, “Imaculada”.
Dizíamos que hoje é um dia de júbilo por inúmeras razões.
É um dia de grande alegria porque toda a Santíssima Trindade é glorificada por sua obra-prima, aquela obra que estava na inteligência divina desde toda a eternidade, sempre associada ao Verbo de Deus Encarnado. A perfeição de Maria, a ausência de pecado e a sublimidade de suas virtudes nos permite ter um espelho da justiça divina, nos permite ver um reflexo da santidade divina e amar mais profundamente a Deus. Eis porque Maria é chamada “Espelho de Justiça”.
É um dia de grande alegria porque Nosso Senhor Jesus Cristo é honrado. Ora, parte da honra dos filhos está nos pais. O fato de Nossa Senhora nunca ter estado sob o mínimo domínio do pecado é uma grande honra para seu Filho, Cristo. O contrário, quer dizer, se Nossa Senhora tivesse conhecido o pecado, seria certa desonra para Nosso Senhor. Ora, em Cristo não há nenhuma desonra; é preciso, então, que Nossa Senhora seja concebida sem pecado.
Hoje é um dia de grande alegria porque honramos também a Nossa Senhora, quer dizer, damos testemunho de sua excelência. Pois isso é honrar: dar testemunho da excelência de alguém. Nós reconhecemos que ela nunca esteve sob o domínio do pecado.
A Imaculada Conceição, como todo privilégio dado à Maria, é uma preparação ou uma consequência da Maternidade Divina. Ora, para ser digna Mãe de Deus não convinha que Maria estivesse submetida ao pecado, não só no momento de sua concepção, mas durante toda a sua vida. Aquela que tanto cooperou na nossa Salvação não pode jamais ter estado sob o domínio do pecado e do demônio. Maria Santíssima foi concebida sem pecado e permaneceu pura de todo pecado e até mesmo de qualquer inclinação ao pecado durante toda sua vida. Em Maria, as paixões ou os sentimentos eram sempre ordenados pela razão e a razão inteiramente ordenada pela fé.
Todavia, a ausência de pecado em sua concepção e em toda a sua vida são simplesmente o aspecto negativo da Imaculada Conceição. Devemos, para testemunhar devidamente as excelências de Maria no Mistério da Imaculada Conceição, considerar também o aspecto positivo desse Mistério.
O primeiro ponto é que onde não há pecado, há, necessariamente, a graça, a amizade com Deus. Nossa Senhora foi, portanto, concebida em estado de graça. Mas não uma graça qualquer. A graça de Maria no momento de sua concepção é uma graça maior que a graça de todos os santos e anjos no céu. Repito: a graça de Maria no momento de sua concepção é maior que a graça de todos os santos e anjos no céu. Assim o dizem os mariólogos. E isso porque a preparação, ainda que distante, para se tornar Mãe de Deus exige uma graça superior a todas as outras graças juntas. A cada dignidade corresponde uma graça proporcional. A cada missão a graça necessária para cumprir bem essa função. A dignidade e a função de Mãe de Deus é imensamente superior a qualquer outra. Portanto, mesmo a preparação para essa dignidade exige uma graça imensamente superior a todas as outras, mesmo juntas.
Além disso, quanto mais algo está perto da causa, mais ela sofre o efeito. Quanto mais algo está perto de fogo, mais ele é esquentado. Maria Santíssima, pela Maternidade Divina, está o mais perto possível de Cristo, fonte da graça. Essa proximidade tem como efeito uma graça que não podemos calcular. E essa graça de Nossa Senhora foi crescendo ao longo de toda a sua vida, pois cada ato seu era feito com uma caridade mais intensa que o ato anterior. A graça em Nossa Senhora progredia em movimento acelerado, dada a sua fidelidade perfeita às inspirações divinas. Se já em sua Conceição Imaculada sua graça era superior a de todos os santos e anjos juntos, podemos imaginar quão ardente era sua caridade no final da vida.
Diga-se, de passagem, que toda essa plenitude de graça de Maria é um pálido reflexo da graça de Cristo. A graça de Cristo era tão grande, desde o momento de sua concepção, que não podia haver maior, de tal sorte que a graça de Cristo não podia nem mesmo crescer durante a sua vida. E, claro, junto com essa plenitude de graça em Maria Santíssima estavam também todas as outras virtudes em grau imenso: a fé, a esperança, a caridade, a prudência, a justiça, temperança, a fortaleza, a humildade, a modéstia, a paciência, a obediência e todas as outras.
Devemos, então, nesse 8 de dezembro, nos alegrar com tamanha excelência de Nossa senhora, com tamanha caridade, com tamanha fidelidade à graça, com tamanha adesão a Deus. Devemos, contudo, ter sempre em mente que Nossa Senhora guardou em cada momento de sua vida a liberdade, embora Deus a tenha assistido de modo particular.
Louvemos, portanto, à Maria, cantando suas excelências.
E o último motivo de alegria para nós é o bem de nossa própria alma. O dia da Imaculada Conceição deve favorecer em nós a devoção à Maria Santíssima, devoção que devemos ter, pois Deus quis que nos dirigíssemos ao Céu pelo mesmo caminho que Ele usou para vir até nós. Devemos ser devotos de Maria, pois Cristo nos entregou a ela como filhos. A devoção consiste na prontidão da vontade em se entregar às coisas que pertencem ao serviço de Deus. A devoção é, portanto, algo que está na vontade e não no sentimento. Ser devoto de Maria é estar sempre pronto para servi-la, a fim de poder melhor servir a Deus. Trata-se de melhor servir a Deus servindo a Maria, como fizeram os empregados nas bodas de Caná, obedecendo à Maria, a fim de obedecer a Cristo.
Todavia, essa prontidão no serviço a Maria para melhor servir a Cristo não brotará espontaneamente em nossas almas. A devoção tem duas causas: a primeira é Deus, a segunda é a meditação. Assim, se queremos ser verdadeiros devotos de Maria, servindo-a pela imitação de suas virtudes – que vimos são sublimes – devemos, primeiramente, pedir essa graça a Deus e a ela mesma. Devemos, ao mesmo tempo, considerar as virtudes de Maria Santíssima, pois dessa consideração nascerá o desejo de imitar essas virtudes, imitação que é a verdadeira devoção a Maria Santíssima.
Portanto, grande alegria nesse dia de hoje. Alegria porque com a Imaculada Conceição a Santíssima Trindade é glorificada ao mostrar ao mundo a sua obra-prima. Alegria porque Nosso Senhor Jesus Cristo é honrado, pois a honra dos filhos depende em parte da perfeição dos pais. Alegria porque Nossa Senhora é honrada, e isso não só pela ausência do pecado, mas pela presença sublime de todas as virtudes. Alegria porque a admiração e a consideração dessas virtudes são o primeiro passo para imitá-las. Alegria porque Nossa Senhora nos mostra o caminho da salvação. Ela nos mostra e nos transmite, qual um aqueduto, as graças que precisamos para chegar à salvação. Ela é a estrela da manhã que anuncia o sol. E onde há sol, já não pode haver trevas. Por sua Imaculada Conceição ela nos ensina o ódio ao pecado e o amor a Deus.
Um parêntese. Alegria também porque essa Virgem Imaculada, Mãe de Deus, está nos céus e intercede por nós, por cada um de nós, e esmaga todas as heresias. Nesse tempo de apostasia generalizada, especialmente a partir do anos 60, recorramos à Imaculada Conceição. E confiança. Nossa Senhora manteve a fé, não se escandalizou. Alegria, Nossa senhora esmaga todas as heresias.
Ó Maria concebida sem pecado…
Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.