[Oração] Meditações para a Via Sacra

Prezados leitores, salve Maria! A pedido do Pe. Daniel publicamos abaixo (e disponibilizamos para download) as meditações da Sexta-Feira Santa (2014) para a Via Sacra .

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1ª Estação

Jesus é condenado à morte

Nosso Senhor está no Pretório de Pilatos. Eis o Homem. Ecce homo. Eis aqui o homem por excelência, o Homem em quem Deus colocou todas as suas complacências. Mas ele é o homem por excelência porque ele é também Deus. E essa a causa de seus sofrimentos: Ele afirmou a verdade de sua divindade, mas os seus não o receberam. Vós sois, meu Jesus, o verbo de Deus feito carne, vindo para satisfazer perfeitamente a Deus por nossos pecados, ofensas infinitas feitas a Deus. Vós viestes para satisfazer, é evidente, mas sobretudo para nos mostrar Vosso amor, capaz de suportar os maiores sofrimentos, físicos e morais, e de suportá-los para o nosso bem, para nossa salvação. Deus amou tanto o mundo que nos deu seu próprio Filho, nos diz São João. Percorramos, então, o caminho da Cruz de Jesus Cristo, mas não o percorramos como os fariseus ou os chefes dos sacerdotes, com verdadeira malícia. Não sigamos o exemplo de Pôncio Pilatos, que por fraqueza e frouxidão entregou Cristo a seus carrascos. E se nós não podemos seguir o exemplo da Imaculada Virgem Maria, que se uniu perfeitamente aos sofrimentos de seu Filho, tornando-se corredentora, sigamos o exemplo do bom ladrão e das santas mulheres, que reconhecendo seus pecados e a bondade e misericórdia divinas, converteram-se inteiramente a NS. Dai-nos, Senhor, a verdadeira detestação de nossos pecados e uma grande dor por tê-los cometido. Dai-nos, Senhor, o firme propósito de evitar de agora em diante todo pecado. Dai-nos a graça de vos amar de toda a nossa alma, com todas as nossas forças.

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2ª Estação

Jesus levando a cruz às costas

Ah, meu Jesus, vós transmitistes vossa doutrina celestial não só pelas palavras, mas também pelo exemplo. Vós dissestes: “se alguém quer vir após mim, que ele renuncie a si mesmo, que ele carregue a sua cruz e que me siga.” E sois vós o primeiro a carregar a Cruz, a Cruz mais pesada que pode existir.

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[Sermão] É preciso rezar, e rezar bem.

Sermão para o Quinto Domingo depois da Páscoa
5 de maio de 2013 – Padre Daniel Pinheiro

 

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…

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É o terceiro domingo seguido, caros católicos, em que Nosso Senhor Jesus Cristo nos fala de sua subida aos céus, de sua Ascensão, que será comemorada na próxima quinta-feira, quarenta dias depois de sua Ressurreição. A Ascensão de Nosso Senhor é, à primeira vista, um motivo de tristeza para os Apóstolos e para os discípulos do Mestre, ainda muito voltados para as coisas terrenas. Da mesma forma, poderíamos pensar que, para nós, nossa alegria seria muito maior com a presença de Nosso Senhor na Terra. Todavia, era preciso que Cristo subisse ao Pai, para sentar-se à direita dEle – nem acima, nem abaixo, mas à direita – para manifestar a igualdade de natureza com o Pai. Era preciso que Cristo subisse aos céus também para manifestar, definitivamente, que seu sacrifício sobre a cruz foi perfeitamente aceito por Deus. Além disso – manifestar a divindade de Cristo e a aceitação de seu sacrifício – a Ascensão tem também consequências excelentes para nós. Nosso Senhor afirma que é bom para nós que ele suba ao Pai, a fim de poder enviar o Paráclito, que ensinará toda a verdade aos apóstolos,  mas também porque no céu Ele intercederá por nós diante do Pai. Assim como o sumo sacerdote do Antigo Testamento entrava no Santo dos Santos para interceder pelo povo, Cristo entra na glória celestial para interceder por nós, como nos diz São Paulo (Hebreus VII, 25), pois sua simples presença, com sua natureza humana e as chagas gloriosas de seu sacrifício, é já uma intercessão por nós. Deus, vendo a natureza humana de Cristo, terá misericórdia daqueles que Cristo veio salvar, terá misericórdia de nós.

Tendo sido fortalecido na fé quanto à divindade de Cristo e de sua intercessão por nós no céu, podemos dirigir, com toda confiança, nossas orações a Deus. E tudo o que pedirmos em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, explicitamente ou implicitamente, obteremos, nos diz Ele no Evangelho de hoje. Todavia, nosso Salvador diz em outra ocasião que no dia do juízo haverá muitos que invocaram seu nome, mas que não se salvaram. E quantas vezes, de fato, nossas orações não são atendidas, apesar de invocarmos a mediação de Cristo. Isso se explica facilmente, caros católicos. Não basta rezar, invocando o nome de Nosso Senhor. É preciso rezar bem. O apóstolo São Thiago nos diz claramente: “Vós pedis e não recebeis porque pedis mal” (Thiago IV, 3).

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Para rezar bem, é preciso primeiramente, que nossa alma esteja em boas disposições. Em seguida, é preciso pedir coisas boas, quer dizer, coisas que nos dirigem para Deus. Finalmente, é preciso pedir de um modo digno da majestade divina à qual nos dirigimos. Se seguimos esses três pontos, nossa oração será atendida.

É preciso, então, que estejamos bem dispostos. Isso significa que, quando rezamos, devemos estar em estado de graça, em amizade com Deus ou pelo menos não devemos estar endurecidos no mal, se por infelicidade nos afastamos de Deus pelo pecado. Deus não costuma ouvir o homem que, endurecido no mal e sem se preocupar com o estado de sua alma, recorre a Ele somente para pedir coisas temporais. E se às vezes Deus o ouve, pode se tratar mais de uma punição do que de um favor propriamente dito. Evidentemente, se o pecador começa a querer detestar seu pecado e começa a voltar-se para Deus, Ele, infinitamente bom e misericordioso, olhará com compaixão e amor para o pecador e lhe dará graças de conversão, penitência e perdão. Para rezar bem devemos estar bem dispostos.

Em seguida, devemos pedir algo que é bom. Acabamos de ouvir Nosso Senhor dizer no Evangelho: tudo o que pedirdes a meu Pai em meu nome, Ele vos dará. Ora, Deus, sendo a bondade perfeita, nos dá tudo aquilo que pedimos, desde que isso seja uma coisa boa. Se Ele nos desse algo ruim, Ele estaria em contradição com sua bondade infinita. E uma coisa é boa nessa terra se ela nos ajuda, de um modo ou de outro, a ganhar o céu. Assim, quando pedimos a nossa salvação ou coisas necessárias para a nossa salvação – como as virtudes, por exemplo, ou quando pedimos para vencer um vício – nós podemos estar seguros de que seremos atendidos, se estamos bem dispostos e se observamos as outras condições das quais falaremos em breve. Podemos também e devemos pedir coisas temporais (como a saúde, por exemplo, e bens materiais). Mas como essas coisas podem tanto nos aproximar quanto nos afastar de Deus, com muita frequência Ele não nos concede esses bens temporais, pois eles nos afastariam de sua divina majestade. Vale muito mais ser doente e suportar em união com Deus e com paciência uma doença do que estar com saúde, mas utilizar essa saúde para fazer o mal. Assim, quando pedimos coisas temporais a Deus, devemos nos submeter inteiramente à sua divina sabedoria, que poderá nos conceder ou negar tais bens em virtude da utilidade ou não deles para a nossa salvação. E Ele sabe muito melhor do que nós o que é útil para nossa salvação. Dessa forma, nossa oração deve ter por objeto todo bem espiritual que nos dirige para a nossa salvação. Nossa oração pode ter por objeto também as coisas temporais, sabendo que Deus pode atender a essa oração ou não, na medida em que esses bens temporais são bons ou não para a nossa alma. Para rezar bem, é preciso, então, uma boa disposição e é preciso pedir coisas boas. Santo Agostinho diz que aquele que pede coisas contrárias à salvação, não as pede em nome de Cristo, por mais que o nome de Nosso Senhor seja invocado.

Além de ter uma boa disposição e de pedir o que é bom, devemos pedir de uma maneira que seja digna da majestade divina à qual nos dirigimos. Isso quer dizer que devemos rezar com uma verdadeira piedade. Essa piedade não se confunde com um ardor mais ou menos sentimental. Ao contrário, essa piedade se realiza com a atenção, com a humildade, com a confiança e com a perseverança.

Devemos, então, rezar com atenção: a distração voluntária – enfatizo bem: voluntária – acompanha muito mal o pedido de algo que não nos é devido. Como desejar que Deus ouça os nossos pedidos, se nós mesmos não escutamos aquilo que estamos dizendo? Se rezamos sem atenção, com sonolência, pensando em mil coisas alheias à oração, já não se trata de oração, pois nossa inteligência e vontade se aplicam a outra coisa. Honramos Deus com os lábios, mas não com o nosso coração, com nosso espírito. Assim, devemos evitar as distrações voluntárias e combater as distrações involuntárias. E, se por fraqueza, não conseguirmos vencer as distrações involuntárias, nossa oração será, mesmo assim, plenamente agradável a Deus, pois fizemos o possível, com generosidade, para afastá-las, combatendo-as. Para evitar as distrações, é preciso escolher, na medida do possível, as circunstâncias que favoreçam a oração. Circunstâncias de lugar, horário… Ao rezarmos, devemos evitar também toda precipitação, rezar muito rápido, comendo as palavras… Uma Ave-Maria bem dita honra mais a Nossa Senhora e dá mais frutos do que 100 rezadas de qualquer jeito. Rezar com atenção demanda esforço e paciência. Não devemos desistir sob pretexto de que não conseguimos; devemos progredir, ainda que lentamente.

Não basta rezar com atenção, devemos rezar com humildade. A Sagrada Escritura nos ensina que Deus resiste aos soberbos, mas que Ele dá a sua graça aos humildes. Devemos, então, quando rezamos, nos apresentar diante de Deus como o publicano, reconhecendo nossa incapacidade, nossas misérias, nossas fraquezas, nossa indignidade. Essa humildade é, antes de tudo, interior e ela faz que nos apoiemos unicamente na misericórdia infinita de Deus e nos méritos infinitos de Cristo. Essa humildade interior termina por se manifestar também exteriormente: o publicano não ousava nem levantar seus olhos. Se nos apresentamos diante de Deus com presunção e arrogância, com grande estima de nós mesmos e para mostrar nossas virtudes, nossas orações serão infalivelmente estéreis. Elas serão também estéreis se, mais do que orações, elas são exigências, como se Deus fosse obrigado a nos dar aquilo que pedimos. Deus resiste aos soberbos. Mas a oração daquele que se humilha penetra nos céus.

A piedade na oração implica também uma grande confiança. Nossa oração deve ser confiante porque ela se dirige a Deus, que é todo-poderoso e que quer o melhor para nós. Nossa oração se dirige à infinita bondade de Deus, que nos governa, que cuida de nós e que quer o melhor para nós. Se Deus nos ajuda – e felizmente – mesmo quando não pedimos, como foi o caso nas Bodas de Caná, podemos ter certeza que Ele nos ouvirá se rezamos bem. Essa confiança na oração é um preceito dado por São Thiago : “se alguém quer pedir algo a Deus, peça com confiança.” Não deixemos de ter essa confiança, caros católicos, em nossas orações.

A última qualidade da oração piedosa é a perseverança. Não basta pedir um instante, uma vez ou algumas vezes para sermos ouvidos, como se pudéssemos determinar o momento em que Deus deve nos conceder seus favores. Deus nos pede a perseverança na oração porque com muita frequência Ele não nos atende imediatamente, a fim de provar e purificar a nossa fé e confiança, a fim de nos fazer rezar mais, a fim de nos fazer apreciar melhor suas graças ou por outra razão digna de sua sabedoria. Vejamos, por exemplo, a perseverança do paralítico na piscina probática: ele esperou 38 anos, ele perseverou durante 38 anos. E por que Deus fez esse paralítico esperar 38 anos ? Para que ele fosse curado pelo Messias e para que, por meio dessa cura, os outros pudessem reconhecer o Verbo de Deus encarnado. Após 38 anos de espera, a cura foi muito mais perfeita não somente para o paralítico mas também para os outros. A espera de 38 anos foi recompensada pela cura da alma dos que presenciaram a cena. E quantos exemplos de perseverança no Evangelho: a cananéia, que insiste para que Nosso Senhor dê as migalhas destinadas aos cachorros, o amigo importuno que pede o pão e tantos outros.

Devemos, ainda, acrescentar um desejo ardente de sermos atendidos, pois é a nossa salvação que está em jogo. Devemos rezar com diligência e querendo ser atendidos e não com indiferença ou tibieza. O Anjo disse ao Profeta Daniel: você foi atendido porque você é um homem de desejos

Eis, então, caros católicos, como devemos rezar. Mas falta algo que aumenta muito a eficácia de nossas orações: confiá-la nas mãos de Maria Santíssima para que ela apresente nossas súplicas ao seu Filho.

Assim, se não estamos endurecidos no pecado, se pedimos coisas úteis para nossa salvação, e as pedimos com atenção, humildade, confiança, perseverança e fervor, seremos sempre e infalivelmente atendidos por Deus, se pedimos algo para nós mesmos. Rezemos, então, e rezemos muito e rezemos bem porque a oração bem feita é o alimento da nossa alma. Ela é a arma de defesa e de ataque contra o demônio, as tentações, o pecado. A oração bem feita é a chave dos tesouros celestes. Ela é o grande meio para nossa santificação e salvação. E se temos dificuldades para fazer uma boa oração, e certamente o temos, façamos como os Apóstolos e peçamos a Nosso Senhor que nos ensine a rezar, porque aquele que reza bem se salva, enquanto aquele que não reza se condena.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

Orações para o tempo de Sé Vacante

Oração para a eleição do Soberano Pontífice

(tirada da Missa Votiva Pro Eligendo Summo Pontífice )

Com toda a humildade imploramos, Senhor, de vossa grande misericórdia, para a Santa Igreja Romana, um Pontífice tal que sempre Vos agrade por seu zelo piedoso, e atraia a veneração contínua do Vosso povo por seu sábio governo. Por Cristo Nosso Senhor.

Oração pela Santa Igreja

(tirada da Missa Votiva Contra Persecutores Ecclesiae)

Acolhei, Senhor, aplacado as preces da Vossa Igreja, a fim de que, destruídos todos os erros e as adversidades, ela possa Vos servir em segura liberdade. Por Cristo Nosso Senhor.
 
Lorenzo Veneziano (1369)

Lorenzo Veneziano (1369)

[Sermão] Programa para a Quaresma: a Cruz, a caridade, a oração e a batalha contra o defeito dominante

Sermão para o Domingo da Quinquagésima
10 de fevereiro de 2013 – Padre Daniel Pinheiro

 

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…

“Se não tiver a caridade, nada sou.” (I Cor, 13)

Três dias somente nos separam do começo da Quaresma. A Santa Igreja continua a nos preparar e a nos dispor, pela Sagrada Liturgia, a uma Quaresma que possa o dar frutos eternos. Para tanto, a Igreja nos apresenta o sublime elogio da caridade na Epístola de São Paulo e nos apresenta, no Evangelho, o anúncio da paixão e a cura de um cego. Mas como essas três coisas nos preparam de maneira perfeita para a Quaresma, pois não parece haver muita relação entre elas?

Para compreender o que a Igreja quer nos ensinar, devemos, antes de tudo, considerar bem a finalidade da Quaresma. A quaresma são quarenta dias de conversão, quarenta dias para que possamos morrer ao pecado com Nosso Senhor Jesus Cristo, a fim de ressuscitar com Ele para a vida da graça. Para fazer isso, precisamos da penitência, pela qual, com verdadeira dor e detestação de nossos pecados, satisfazemos pela ofensa feita a Deus. Todavia, a penitência sozinha não serve para nada, se ela não é inspirada pela caridade, quer dizer, ela não serve para nada se ela não é feita em união com Deus ou tendo em vista essa união com Deus, essa amizade com Deus. E isso porque a melhor das ações não tem valor algum para a salvação, se ela não é acompanhada da caridade ou se ela não tem por fim a caridade. Além disso, como somos fracos e inconstantes e sem Deus nada podemos fazer, devemos pedir a Deus, pela oração, que nossas penitências acompanhadas da caridade sejam agradáveis aos seus olhos.

Dessa forma, podemos compreender porque a Igreja escolheu estas passagens da Sagrada Escritura para o Domingo que precede a quaresma. A Igreja anuncia a Cruz, para que satisfaçamos pelos nossos inumeráveis pecados. Ela faz o elogio da caridade porque sem a caridade nada tem valor, dado que só a caridade ordena tudo a Deus. E, finalmente, ela nos apresenta a cura do cego, na qual encontramos um modelo de oração: “Filho de David, tende piedade de mim.” Assim, não podemos fazer uma penitência sincera sem ter por finalidade a união com Deus. E, ao mesmo tempo, não podemos estar verdadeiramente unidos a Deus se recusamos carregar a nossa própria cruz, quer dizer, se recusamos fazer penitência. A cruz e a caridade são inseparáveis nessa Terra. Todavia, nem a caridade nem a cruz podem existir sem a oração, pois sem Deus nada podemos fazer. É preciso fazer penitência não para se orgulhar, não para se mostrar aos outros, mas para recobrar ou aumentar a nossa amizade com Deus, pedindo-lhe, pela oração, essa amizade. Durante a Quaresma, a união da penitência, da oração e da caridade é indispensável. Uma Quaresma sem um desses três elementos seria uma Quaresma infrutífera, que não conduziria a uma união profunda e duradoura com Deus, união que é, justamente, o objetivo da Quaresma. É por isso que, tradicionalmente, recomendam-se esforços nesses três frontes durante a Quaresma: penitência (privar-se de algo que gosta, por exemplo), oração (determinar dias de visita ao Santíssimo, rezar um terço a mais, ou outra devoção) e obras de caridade (como, por exemplo, esmolas ou as obras de misericórdia corporais e espirituais).

Gostaria, porém, de dar um exemplo e uma sugestão, caros católicos, de resolução para essa Quaresma. Exemplo e sugestão de uma resolução que une muito bem esses três elementos de que acabamos de falar. Trata-se do combate de cada um contra seu defeito dominante.

O demônio, inimigo do homem, é como um leão que ruge ao nosso redor, procurando nos devorar. Com muita inteligência, ele busca, precisamente, nos atacar em nosso ponto fraco. Assim, ele faz a ronda para examinar todas as nossas virtudes teologais, cardeais e morais, e é no ponto em que nos encontra mais fraco, é nesse ponto, que é o mais perigoso para a nossa salvação, que ele nos ataca e tenta nos abater. Como um bom chefe de guerra, ele sabe que uma vez tomado o ponto mais fraco de nossa alma, o menos virtuoso, ele vai se tornar o mestre de todo o resto de nossa alma. Esse ponto mais desprovido de virtude, o mais arruinado pelas nossas más inclinações é justamente o nosso defeito dominante, que é também a raiz, a causa de muitos outros pecados. Esse defeito dominante pode ser muito diverso segundo cada pessoa: o orgulho, a vaidade, a sensualidade, a impureza, a falta de modéstia, o respeito humano, o apego aos bens desse mundo, o apego às honras ou à glória desse mundo. Ele pode ser a preguiça, sobretudo a preguiça espiritual, a falta de espírito sobrenatural, a falta de esperança, a inconstância, o espírito mundano, a cólera, etc…

É fácil ver a importância de combater nosso defeito dominante e isso por duas razões principais. Primeiramente, porque é do defeito dominante que nos vêm os maiores perigos para a nossa alma e as mais graves ocasiões de pecado. Como dissemos, ele é a raiz para vários outros pecados. Segundo, podemos ver a importância de combater o defeito dominante pelo fato de que, uma vez vencido o inimigo mais terrível, os inimigos mais fracos serão facilmente derrotados por nossa alma, que se tornou mais forte em razão da primeira vitória. Devemos agir como o Rei da Síria na guerra contra Israel. Esse Rei ordenou aos seus soldados que combatessem unicamente contra o Rei de Israel, prometendo que a morte do Rei inimigo daria uma vitória fácil sobre o resto do exército israelita. Foi exatamente o que aconteceu: tendo morrido o rei de Israel, todo o exército cedeu e a guerra terminou imediatamente. De maneira semelhante, caros católicos, será muito mais fácil vencer nossos outros defeitos quando tivermos vencido o nosso defeito dominante.

Para que sejamos vitoriosos nesse combate, é preciso, todavia, seguir o conselho da Igreja. A vitória sobre o nosso defeito dominante não ocorre sem os sofrimentos, sem as cruzes, sem as privações. É impossível vencê-lo sem a mortificação, sem a penitência. Do mesmo modo, sem a oração – sem muita oração – é igualmente impossível vencê-lo e até mesmo começar a batalha, pois é Deus que nos dá a força para combater e é Deus que nos dá, em última instância, a vitória. Sem Ele, mais uma vez, nada podemos fazer. Finalmente, é a caridade, a vontade de servir Deus, infinitamente bom e amável, que deve nos animar e nos dispor ao combate. São a cruz e a oração simples – mas eficaz – do cego que nos são lembradas pelo Evangelho. É a caridade – absolutamente necessária – que nos lembra São Paulo no sublime elogio da caridade. Mas para não se enganar a respeito de seu próprio defeito dominante, é necessário pedir o auxílio de Deus, para que Ele mostre qual é esse defeito e convém pedir conselho a um padre bom que conheça sua alma.

Se, caros católicos, conseguirmos vencer ou ao menos começar uma batalha séria contra nosso vício dominante – porque às vezes é preciso muito tempo para vencê-lo, como foi o caso, por exemplo de São Francisco de Sales com a ira – o caminho da santidade estará bem traçado, pois dessa forma cortamos o mal pela raiz, cortamos o mal em sua causa e evitamos todos os frutos ruins, que são os pecados. Com essa má árvore cortada, poderemos praticar com facilidade e alegria a virtude e o bem, avançando no caminho da perfeição.

Em todo caso, caros católicos, durante a Quaresma, não esqueçam nem um só desses três elementos: a penitência, a oração e a caridade. Com eles teremos uma Quaresma com frutos abundantes e duradouros porque teremos avançado em direção à vida eterna, satisfazendo por nossos pecados e nos dispondo à graça. Sem esses elementos, nossa Quaresma até poderá produzir alguns frutos, mas eles permanecerão superficiais e passageiros. Portanto: a cruz, a oração, a caridade. Isso é o resumo do Evangelho, o resumo da vida de Nossa Senhor Jesus Cristo. Deve ser também o resumo de nossas vidas.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.