[Sermão] A Ressurreição de Cristo

Sermão para o Primeiro Domingo depois da Páscoa (Domingo in Albis)
07 de abril de 2013 – Padre Daniel Pinheiro

 

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…

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Estamos hoje na Oitava da Páscoa, no denominado Domingo in Albis, quer dizer, no Domingo em branco. Os catecúmenos que haviam sido batizados na Vigília da Páscoa guardavam a roupa branca, simbolizando a pureza batismal e o dever de conservá-la ao longo da vida, durante toda essa semana e a tiravam nesse Domingo. Esse Domingo também é chamado de Quasi modo, das primeiras palavras do Intróito.

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Dominus meus et Deus meus. Meu Senhor e meu Deus.

Comemoramos, caros católicos, ao longo desses oito dias, a Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo. O milagre da Ressurreição de Cristo é a prova definitiva de sua divindade, a prova definitiva que aquilo que nos falou e ensinou é verdade. A prova definitiva de que Ele é a Verdade, o Caminho, a Vida. Só Deus pode fazer um milagre, quanto mais ressuscitar um morto e ressuscitá-lo para a vida eterna. Nosso Senhor, sendo homem e Deus, ressuscitou a si mesmo, em virtude de sua divindade, que continuou unida ao seu corpo e à sua alma após a morte.

Sendo a Ressurreição de Nosso Senhor a prova definitiva de sua missão divina e de sua divindade, sendo sua Ressurreição um argumento irrefutável de que devemos crer naquilo que disse e praticar aquilo que ensinou, muitos ao longo da história quiseram negar a Ressurreição do Salvador, a fim de continuarem a seguir suas próprias paixões e suas próprias invenções. Não há escolha: ou Cristo ressuscitou e é Deus e devemos consequentemente segui-lo, ou Ele não ressuscitou e, nesse caso, vã seria a nossa fé, como diz São Paulo.

É óbvio que a Ressurreição de Cristo é um fato certo, caros católicos. Para compreendermos isso, é preciso saber primeiramente que a morte de Nosso Senhor é um fato certo e não uma aparência como disseram alguns. Ele morreu na Cruz à vista de todos, teve seu coração transpassado pela lança. Pilatos entregou o corpo de Cristo a José de Arimatéia somente depois de ter certeza de que Cristo estava morto. Os discípulos fiéis e as santas mulheres tiraram o corpo de Nosso Senhor da Cruz e o prepararam, ainda que rapidamente, pois era véspera do sábado, para colocá-lo no sepulcro. Se eles tivessem a menor esperança de que Ele estivesse vivo, não o teriam sepultado. Nosso Senhor morreu verdadeiramente e por isso Ele quis ficar três dias no sepulcro, para demonstrar a realidade de sua morte. Também o fato de ter sido sepultado é um fato indiscutível. E Nosso Senhor não foi colocado numa fossa comum, mas em um túmulo novo, aberto na rocha, túmulo que pertencia a José de Arimatéia, membro do Sinédrio, discípulo de Cristo e homem rico, capaz de ter um túmulo novo a pouca distância do Monte Calvário. Tanto é assim que os chefes dos judeus enviaram soldados para vigiar o túmulo. A lei romana em vigor na época mandava que o corpo dos supliciados fosse entregue aos amigos e parentes. Nosso Senhor morreu e foi sepultado, como recitamos no Credo. Não há dúvida.

Ao terceiro dia, Ele ressurgiu dos mortos. Voltando ao sepulcro no domingo para completar a preparação do corpo de Nosso SEnhor, as santas mulheres e depois os Apóstolos encontraram o túmulo vazio. Todas as hipóteses foram feitas para explicar esse fato de uma forma puramente natural. Sucessivamente, os Apóstolos, as santas mulheres, José de Arimatéia e até mesmo os chefes dos Judeus foram acusados de terem tirado o corpo do Salvador do Sepulcro. Evidentemente, nenhuma dessas hipóteses é minimamente plausível. Tudo se opõe à hipótese de que os discípulos tenham tirado o corpo de Jesus do sepulcro. Durante a paixão e morte de Jesus, eles o abandonaram, fugiram com medo de morrer e Nosso Senhor ainda estava vivo. Agora que Cristo está morto eles teriam coragem para enfrentar os soldados e tirá-lo do sepulcro? Além disso, o fato de levar o corpo de um lugar para o outro era uma profanação, proibida pela Lei, ainda observada pelos discípulos. Os soldados, com medo de serem castigados, disseram que os discípulos haviam tomado o corpo de Cristo enquanto estavam dormindo. Mas se os soldados estavam dormindo, como poderiam saber que os discípulos tiraram o corpo de Cristo do sepulcro? O Corpo do Mestre não foi tirado pelos discípulos. Nem pelos chefes dos judeus. Se os chefes dos judeus tivessem tirado o corpo de Cristo do sepulcro, bastaria expô-lo ao público, quando os Apóstolos começaram a pregar a Ressurreição de Nosso Senhor, para destruir o cristianismo. Mostrar o corpo de Cristo morto seria muito mais eficaz do que as perseguições.

A crença na ressurreição também não se trata, caros católicos, de alucinação individual ou coletiva, nem de crença por autossugestão. Os Apóstolos e os discípulos não tinham praticamente nenhuma inclinação a acreditar na Ressurreição, apesar de Cristo tê-lo anunciado algumas vezes. Maria Madalena, os discípulos de Emaús, os Apóstolos, e, no Evangelho de hoje, São Tomé, só acreditam depois de uma prova definitiva da Ressurreição de Cristo, depois de vê-lo e de comprovarem que é Nosso Senhor com verdadeiro corpo, que come, que pode ser tocado. E as aparições de Nosso Senhor Ressuscitado são a prova direta de sua Ressurreição. O Santo Evangelho nos narra nove. Para Maria Madalena, para as santas mulheres, para São Pedro, para os discípulos de Emaús, aos Apóstolos, São Tomé estando ausente. Oito dias depois, na oitava de sua Ressurreição, Cristo aparece novamente aos Apóstolos, com São Tomé presente: é o Evangelho de hoje. E duas aparições na Galiléia, uma no Lago de Tiberíades, e uma sobre uma montanha. Ele apareceu a 500 discípulos, diz São Paulo e, finalmente, no monte das Oliveiras, antes de sua Ascensão  E o Evangelho é digno de fé. O valor histórico deles é indiscutível. A autenticidade também é indiscutível. São os Apóstolos e os Evangelistas que nos narram a verdade do que aconteceu. Qualquer historiador sério e de boa-fé chega a essa conclusão, a partir da ciência histórica. Além disso, sabemos que os Evangelhos são inspirados por Deus, isentos de qualquer erro, que são a própria palavra de Deus, que não pode se enganar nem nos enganar. Querer negar a Ressurreição é negar irracionalmente a possibilidade do sobrenatural.

Portanto, caros católicos, nossa fé na Ressurreição de Nosso Senhor tem um fundamento sólido e inabalável. E, sabendo que Cristo ressuscitou, nossa fé não é vã. Era necessário que Cristo ressuscitasse por cinco razões, diz São Tomás.

Primeiro, Cristo ressuscita para manifestar a justiça divina, que exalta aqueles que se humilham por obediência e caridade. Cristo se humilhou por obediência e caridade até a morte e morte de cruz. Nada mais conveniente que fosse exaltado pela ressurreição.

Segundo, Ele ressuscita para que mudemos de vida, morrendo com Cristo para o pecado e ressuscitando com Ele para uma vida nova, vida da graça, de virtude.

Terceiro, Cristo ressuscita para nos dirigir para as coisas do alto: se ressuscitamos com Cristo para a vida da graça, arrependidos de nossos pecados, devemos buscar as coisas do alto, onde Cristo está sentado à direita de Deus Pai, devemos apreciar as coisas do alto e não aquelas que estão sobre a terra (Col. 3,12).

Em quarto lugar, Cristo ressuscita para auxiliar a nossa fé quanto à sua divindade. Aquele que ressuscita por seu próprio poder e ressuscita para não mais morrer é verdadeiramente Deus.

Finalmente, Ele ressuscita para nos encher de esperança, pois quando vemos Cristo, nossa cabeça, ressuscitar, esperamos também nós, seus membros, poder ressuscitar, e esperamos com grande confiança.

Se Cristo é verdadeiramente Deus, caros católicos, e não há dúvida possível nisso, como nos mostra o Santo Evangelho e, de modo particular, sua ressurreição, confessemos com São Tomé: Meu Senhor e meu Deus. É essa a conclusão do Santo Evangelho: Meu Senhor e meu Deus. Se Cristo é nosso Senhor e nosso Deus, como não segui-lo em todas as coisas? Como não segui-lo em todas as coisas com alegria e entusiasmo, mesmo nas cruzes? Se Cristo é nosso Senhor e nosso Deus – e Ele o é – precisamos agir em consequência, caros católicos. Precisamos aderir a Ele e a sua Igreja com toda a nossa inteligência, com toda a nossa vontade, com toda a nossa alma, com todo o nosso ser. É dessa adesão total a Nosso Senhro que virá essa verdadeira paz que Cristo deseja três vezes aos seus discípulos no Evangelho de hoje. Poderíamos chamar esse domingo de “domingo da paz”, “domingo da paz de Cristo”, que não é a falsa paz do mundo, do politicamente correto, do indiferentismo religioso, do relativismo, do bom mocismo. A paz de Cristo não exclui o bom combate, mas o pressupõe. Ela exclui, isso sim, o pecado e nos dá a tranquilidade pela graça, pela ordenação da nossa vida a Deus. Para alcançar essa paz, precisamos do sacramento da confissão, instituído por Cristo junto com esse desejo de paz: “recebei o Espírito Santo: a quem perdoardes os pecados, ser-lhes-ão perdoados”. Para alcançar essa paz, morramos com Cristo para o pecado e nasçamos novamente com Ele para a vida da graça, para vida segundo a vontade divina. Para ter essa paz, confessemos com toda força e clareza que Cristo é Deus com nossas palavras e com nossas obras. É essa a fé que venceu e vence o mundo. Não tenhamos medo. É a nossa fé que opera pelas obras que vence o mundo, que nos traz a paz e a vida eterna.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

 

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Sermão para o II Domingo depois da Epifania
20 de janeiro de 2013 – Padre Daniel Pinheiro

 

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave-Maria…

Deixo mais uma vez o texto do Santo Evangelho de hoje de lado – mas não o Evangelho – para tratar de assunto que importa muito para a salvação de nossas almas. Creio que seja evidente, para todos que possuem olhos para ver e ouvidos para ouvir, a crise de fé e de moral em que nos encontramos. Essa crise de fé não é só o abandono de uma ou mais verdades de fé, mas é também o desconhecimento do que é a virtude teologal da fé. A fé, como já dissemos em outra oportunidade (clique neste link para ver sermão anterior), é a adesão da inteligência às verdades reveladas por Deus, em virtude da autoridade divina que não pode se enganar nem nos enganar.

O abandono da verdadeira noção de fé tem levado muitos católicos a um erro contra a fé que é a excessiva credulidade em revelações privadas. A excessiva credulidade consiste em aderir com demasiada facilidade e sem fundamento suficiente a manifestações, profecias ou mensagens de alguém que diz ser favorecido por aparições e revelações privadas. Infelizmente, no Brasil e também no mundo, essas aparições e a crença das pessoas nelas têm se espalhado muitíssimo, com grande prejuízo para as almas.

Antes de tudo, é preciso dizer que toda a verdade necessária para a nossa salvação foi revelada por Nosso Senhor Jesus Cristo e pelo Espírito Santo aos Apóstolos. A Revelação Pública, quer dizer, aquela em que todos somos obrigados a crer para nos salvar, se encerra com a morte de São João Evangelista, o último apóstolo a morrer. Não há nada que a Igreja ensine como divinamente revelado que já não esteja contido nesse depósito confiado aos apóstolos. Nós temos a obrigação de crer na Revelação feita aos apóstolos e transmitida, defendida, explicada até nossos dias pela Santa Igreja Católica, fundada por Nosso Senhor Jesus Cristo.

Quanto às revelações privadas, feitas a uma pessoa ou a um grupo de pessoas, elas não são necessárias para a nossa salvação e não temos nenhuma obrigação de acreditar nelas.

Em 13 de outubro de 1930, pela Carta Pastoral "A Divina Providência", o Bispo de Leiria declara "dignas de crédito as visões das crianças na Cova da Iria" e permite oficialmente o culto de Nossa Senhora de Fátima.

Videntes de Fátima. [Em 13 de outubro de 1930, pela Carta Pastoral “A Divina Providência”, o Bispo de Leiria declara “dignas de crédito as visões das crianças na Cova da Iria” e permite oficialmente o culto de Nossa Senhora de Fátima.]

É preciso, porém, distinguir entre as aparições aprovadas pela autoridade hierárquica da Igreja e as que não são aprovadas. Quanto às aparições que são aprovadas pela Igreja, como, por exemplo, Lourdes, Fátima, Nosso Senhora das Graças, Nossa Senhora de Guadalupe, seria muito orgulho e temerário rechaçá-lasA Igreja as examinou com rigor, a fim de estabelecer a sobrenaturalidade dos acontecimentos. Ela constatou que não há nada que se opõe à fé ou à moral. As aparições devidamente aprovadas pela autoridade hierárquica da Igreja não pertencem ao depósito da fé, mas devem ser consideradas com seriedade e respeito, em particular seguindo os conselhos dados por Nossa Senhora, que são, evidentemente, para o nosso bem espiritual.

Outro é o caso das aparições que não são devidamente aprovadas. Seguir uma aparição que não foi devidamente julgada pela Igreja segundo os critérios tradicionais, pode representar um perigo para a alma. Esse exame rigoroso cabe ao Bispo e à Santa Sé. Não cabe a nós dizer se uma aparição é verdadeira. Não temos elementos para julgar.

Por outro lado, não é tão difícil reconhecer uma aparição falsa.

O primeiro critério para julgar uma aparição diz respeito à pessoa favorecida pela aparição. Deus poderia aparecer e fazer uma revelação privada a um pecador, sem dúvida. Todavia, quase sempre uma verdadeira aparição se faz a alguém que não somente é fervoroso, mas que já se encontra muito avançado no caminho da perfeição. E isso condiz com a sabedoria divina. Alguém que fosse favorecido por uma revelação, sendo ainda imperfeito espiritualmente, ficaria, muito provavelmente, cheio de si e orgulhoso. Ao contrário, uma verdadeira revelação favorece a santidade e, portanto, a humildade.

Além disso, a Igreja considera as qualidades da pessoa favorecida. A Igreja considera as qualidades naturais quanto ao temperamento, quanto à sua saúde mental, a fim de saber se a pessoa não tem propensão a alucinações, à autossugestão e coisas do gênero. A Igreja considera também a sinceridade da pessoa, para saber se ela não tem tendência em aumentar a verdade ou simplesmente inventar fatos. A Igreja considera igualmente as qualidades sobrenaturais. É uma pessoa de virtude sólida ou não? Sua humildade é profunda ou ela gosta de aparecer e de contar aos outros os favores que recebeu? Ela segue os conselhos da autoridade eclesiástica com docilidade ou age por conta própria? A Igreja considera também os frutos da aparição. Houve melhoria nas virtudes, nos costumes daqueles favorecidos pelas aparições e mensagens? Todos esses fatores permitirão um juízo correto da aparição.

O critério mais importante, todavia, para julgar uma aparição, é o acordo ou o desacordo com a doutrina e moral católicas. Se a doutrina ou moral católicas são contrariadas, não há a menor dúvida: a aparição é falsa. Se a doutrina católica não é contrariada, é preciso analisar os outros aspectos.

É indispensável a aprovação da autoridade competente feita depois de exame segundo os critérios tradicionais, pois uma aparição que não foi aprovada pode ser obra humana, mas pode também ser obra do demônio. E, normalmente, quem deseja ser favorecido por graças extraordinárias, como o são as aparições, termina tendo aparições, mas que não encontram sua origem em Deus. São notórias aparições do demônio sob a aparência de Nosso Senhor, de Nosso Senhora ou de Santos. Isso ocorreu algumas vezes com o Padre Pio, por exemplo. É também notório que o demônio faz prodígios e fenômenos extraordinários – que não são em nenhuma hipótese milagres – para tentar legitimar falsas aparições. 

Hoje, temos várias aparições por todo o Brasil e no mundo que não possuem aprovação eclesiástica e muitas – praticamente todas – não terão jamais, pois se opõem à doutrina católica. O problema é que muitos têm seguido essas aparições e mensagens, com prejuízo para as suas almas.

Muitas dessas aparições são apocalípticas, condenando aqueles que não acreditam nelas. Isso é mau sinal, muito mau sinal. Acabamos de dizer que não é necessário crer em aparições privadas para se salvar. Por que nos condenaríamos se não acreditamos em aparições que nem aprovação eclesiástica possuem?

Quanto ao fim dos tempos, nós não sabemos nem o dia nem a hora. Teremos, porém, sinais que nos permitirão reconhecer que ele está próximo: a conversão dos judeus, a apostasia, certos desastres, etc. Ainda assim, não saberemos o quanto o final dos tempos estará próximo. Não creio que sejam necessárias aparições que prevejam o fim iminente do mundo e não creio que isso esteja de acordo com a doutrina católica.

Além disso, essas aparições contêm em si, muitas vezes, uma oposição à análise da hierarquia ou afirmam que não se deve confiar no juízo da hierarquia. Ora, uma verdadeira aparição nunca pode se opor ao juízo da hierarquia, pois isso seria uma contradição em Deus, que estabeleceu a hierarquia, mas ao mesmo tempo pediria para que não se submetesse a ela. Ao contrário, a completa submissão à hierarquia estabelecida por Cristo é indispensável em uma verdadeira aparição. Nossa Senhora mostra isso claramente em Lourdes. É somente depois da proclamação do dogma da Imaculada Conceição que ela aparece dizendo ser a Imaculada Conceição. Ela não o faz antes, a fim de não tomar o lugar do Magistério da Igreja. A docilidade ao exame da autoridade competente está completamente ausente nessas aparições, em que os supostamente favorecidos querem justamente aparecer como favorecidos por Deus e Nossa Senhora, como filhos prediletos deles.

Vale também destacar que algumas dessas aparições têm um caráter mais sério no que toca à liturgia ou no que toca à castidade e à modéstia, por exemplo. Mas isso é simplesmente para enganar os incautos. O demônio, ao perceber que muitos buscam maior seriedade nesses pontos, lhes concede isso, mas os desviam por meio de supostas aparições, sejam elas pura invenção humana, sejam elas obras suas.

Poderíamos continuar aqui citando argumentos contra essas aparições que surgem por toda a parte: no sul do Brasil, aqui no Distrito Federal, em Goiás, no interior de São Paulo e em muitos outros lugares

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Videntes de Medjugorje [Nota: os bispos da Diocese de Mostar-Duvno sempre desaprovaram as aparições: “non constat de supernaturalitate”, conforme declaração da Conferência dos Bispos da Iugoslávia, de 1991.]

É preciso dizer: também a aparição de Medjugorje não tem aprovação nenhuma. Ao contrário, os Bispos do local sempre se opuseram. Pode até ser que alguma alma mude de vida em virtude dessas coisas, mas é porque Deus pode tirar de um mal um bem. Eu dou um conselho para o bem de vossas almas: não sigam essas aparições, não sigam essas mensagens.

Eu dizia, no começo do sermão, que essa moda aparicionista e que a credulidade excessiva têm sua origem em uma falsa noção de fé, na falta de fé sólida. Vejamos o que diz São João da Cruz. O Santo diz diz que o desejo de revelações tira a pureza da fé, desenvolve uma curiosidade perigosa que é fonte de ilusões e que confunde o espírito com imaginações vãs. Continua o Santo dizendo que esse desejo de revelações denota, com frequência, falta de humildade e falta de submissão a Nosso Senhor, que, por meio da revelação pública, feita aos apóstolos, já nos deu tudo o que precisamos para chegar ao céu.

Não devemos basear nossa vida espiritual em aparições não aprovadas. Isso é contra a fé, é o erro da credulidade excessiva. Não caiam na armadilha dessas aparições e se já seguem alguma, deixem-na. No lugar de buscá-las, devemos procurar conhecer melhor aquelas que são plenamente aprovadas (Fátima, Lourdes, etc) e conhecer cada vez melhor nossa fé, estudando o catecismo e a doutrina católica e colocando-a em prática.

Gostaria de dirigir agora algumas palavras à prezada Maria Clara, que vai receber o Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo pela primeira vez. (…)

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

Notas do Editor

  •  A continuação do sermão (Exortação para Primeira Comunhão) encontra-se em post já publicado.
  • Os destaques, imagens e descrições das imagens são iniciativas do Editor; não se obriga (tampouco se proíbe) sua reprodução junto com o texto,  no caso de publicação em outros sites.

[Sermão] “Se há tantos milagres, há uma razão”

Sermão para o 20º Domingo depois de Pentecostes (14 de outubro de 2012) 

Padre Daniel Pinheiro

Dicit ei Jesus vade filius tuus vivit.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria…

“Reconheceu, então, o pai, ser aquela mesma hora em que Jesus lhe dissera: Teu filho vive. E creu ele, e toda a sua casa.”

No Evangelho de hoje, São João nos narra o milagre da cura do filho do oficial do rei. Durante todo o Evangelho abundam os milagres de Nosso Senhor Jesus Cristo. Se há tantos milagres, deve haver uma razão para tanto. Nosso Salvador faz tantos milagres para confirmar a verdade de seu ensinamento e de sua divindade, mas também para mostrar a sua bondade exercendo uma grande misericórdia para com os homens.

O milagre é, por definição, algo feito por Deus fora da ordem da natureza. É uma alteração passageira e pontual da ordem natural, que supera sem dúvida as forças de toda a natureza criada. Acima de todas as criaturas e acima de toda a ordem natural está unicamente Deus. Assim, onde há um verdadeiro e autêntico milagre que altere a ordem natural, devemos concluir que ali está Deus, agindo diretamente por si ou por meio de uma criatura.

É preciso, porém, muita cautela para se afirmar que algo se trata de um milagre. Mas é preciso também reconhecê-lo quando ele existe. E no caso de Nosso Senhor isso é evidente. Ele fala, e os cegos vêem, os surdos ouvem, a língua dos mudos se desata, os paralíticos andam, as enfermidades desaparecem num instante; os que acabam de morrer voltam à vida, os que já estavam sendo levados para o sepulcro saem do caixão, os que enterrados depois de alguns dias e já com o mau cheiro característico, se levantam e saem de seu túmulo. O mar e as chuvas obedecem à voz de Cristo.  Naturalmente falando, tudo isso é impossível. Realizar tais obras pelas simples palavras, ou por um simples gesto, ou utilizando meios desproporcionais como um pouco de saliva e de terra é impossível a toda e qualquer criatura. Uma palavra, um gesto, uma ordem aos elementos da natureza e às doenças, uma ameaça ao demônio basta para Cristo realizar tais coisas. Pela qualidade das obras e pelo modo de fazê-las, fica claro que nesse caso é Deus quem age. E quando Deus age para confirmar um ensinamento, tal ensinamento é necessariamente verdadeiro, de outra forma seríamos enganados por Ele, o que é impossível. Então, aquilo que Cristo ensina é verdadeiro e como Ele nos ensinou a sua divindade abertamente, dizendo, por exemplo, “Eu e o Pai somos um”, devemos confessar que Cristo é verdadeiramente homem e verdadeiramente Deus.

Cristo fez milagres sobre os anjos, colocando-os a seu serviço diante dos homens em seu nascimento, em sua ressurreição, em sua ascensão. Cristo fez milagres sobre os demônios expulsando-os com uma simples palavra. Cristo fez milagres sobre os corpos celestes, com a estrela que guiou os magos, com os céus se abrindo quando de seu batismo por São João Batista, com as trevas que se fizeram presentes durantes sua crucificação. Cristo fez milagres sobre os homens, ressuscitando três, curando toda espécie de enfermidade: lepra, febre, paralisia, cegueira, surdez, mudez, curando à distância, etc. Cristo fez milagres sobre as criaturas racionais, com pescas milagrosas, tempestade acalmada, secando a figueira, multiplicando os pães, rasgando o véu do templo, produzindo terremoto quando de sua morte, etc. Podemos constatar, então, que toda a criação está sob a realeza de Cristo.

Cristo começou a fazer milagres somente ao iniciar a sua vida pública, a sua pregação. Se Cristo fez milagres para confirmar a sua doutrina e para manifestar sua divindade, não convinha que fizesse milagres antes de começar a pregar e sabemos que ele começou a ensinar somente aos 30 anos. E se Cristo deveria mostrar a sua divindade pelos milagres, não convinha fazê-los desde a sua infância, a fim de que a realidade de sua humanidade não fosse colocada em dúvida. Assim, não devemos dar crédito a revelações privadas que contam milagres de Cristo durante a sua infância. São João diz claramente que o milagre nas bodas de Caná foi o primeiro que Jesus fez, manifestando sua glória, e seus discípulos acreditaram nele.

Mas se os milagres têm como finalidade primeira mostrar a veracidade do ensinamento de Cristo e de sua divindade, eles são também expressão de sua infinita bondade misericordiosa. Vemos isso claramente no Evangelho: ao sair da barca, viu uma multidão numerosa, teve compaixão e curou os enfermos; teve compaixão dos que o seguiam e estavam com fome, teve piedade dos cegos em Jericó etc. A pedido de sua Mãe, reconhecendo o embaraço dos noivos em Caná, transformou a água em vinho.  E o povo judeu reconheceu essa bondade de Nosso Senhor e se admirava muito, dizendo: “Ele fez bem todas as coisas. Fez ouvir os surdos e falar os mudos!”

Devemos notar, acerca dos milagres de Cristo, que Ele nunca realizou um milagre em benefício próprio. Sofre de fome durante quarenta dias no deserto, mas não quer transformar as pedras em pão. Tem sede ao lado de um poço, mas, no lugar de saciar sua sede com um milagre, pede água à samaritana. Permite a seus carrascos que o maltratem e o matem na cruz, enquanto podia com uma simples ordem ser defendido por legiões de anjos. Os milagres são para os outros. São para o bem físico dos outros, mas sobretudo para o bem espiritual dos outros, para que possam acreditar em Cristo e reconhecer sua bondade e misericórdia. Devemos destacar também que Cristo nunca operou milagres supérfluos ou por capricho. Todos corresponderam, justamente, a uma necessidade física ou moral.

No Evangelho de hoje, no milagre da cura do filho do oficial do rei, não é diferente. Nosso Senhor cura um doente à distância, dizendo simplesmente “Vai, o teu filho vive.” Pode um homem fazer tal coisa? Pode um anjo fazer tal coisa? Sem dúvida, não. Só Deus pode fazer isso diretamente ou indiretamente. Cristo, sendo verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, o faz. Cristo sabe que os homens precisam dos milagres para poder acreditar em seu ensinamento. Ele mesmo o diz: Vós, se não virdes milagres e prodígios, não credes. Todavia, há um limite para os milagres, pois uma vez realizado um número sufciente para comprovar a veracidade do ensinamento, já não são mais necessários. Hoje, os milagres já não são necessários, embora ainda existam muitos, em particular em Lourdes.  Nosso Senhor é movido, então, pela compaixão face ao sofrimento desse pobre pai e cura seu filho. Nosso Senhor age em benefício de outrem e jamais em benefício próprio.  E Nosso Senhor age não somente para curar fisicamente, mas sobretudo para dar a vida sobrenatural: o pai, tendo constatado a cura do filho, acreditou em Nosso Senhor Jesus Cristo junto com toda a sua casa. Os milagres supõem a fé ou terminam, em certo sentido, gerando a fé.

Reconheçamos, então, nos milagres de Cristo a confirmação inquestionável de sua divindade e de todo o seu ensinamento e reconheçamos também a sua bondade e misericórdia infinitas. Da mesma forma como Cristo ajudou àquelas pessoas quando esteve fisicamente presente entre os homens, ele nos ajudará. Os milagres são hoje mais escassos, pois já temos motivos suficientes para reconhecer a divindade e a bondade de Cristo. Mas se for necessário, Cristo nos ajudará até mesmo com milagres.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

Nota do editor: destaques são nossos.

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[Sermão] “O Terço é a melhor das devoções”

Sermão para o 19º Domingo depois de Pentecostes (7 de outubro de 2012) 

Padre Daniel Pinheiro

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria…

A Batalha de Lepanto

Caros católicos, estamos hoje no 19º Domingo depois de Pentecostes, mas festejamos também a festa de Nossa Senhora do Rosário.  A história da Festa de Nossa Senhora do Rosário é uma história de vitória. A origem da festa, antes chamada de Nossa Senhora da Vitória, está, justamente, na vitória dos católicos sobre os turcos na batalha naval de Lepanto em 1571, sob o Papa São Pio V. A vitória foi atribuída em grande parte às orações e procissões feitas pela Confraria do Rosário durante a batalha. Uma outra vitória dos católicos sobre os turcos, em 1716, na Hungria, permitiu que o Papa Clemente XI tornasse a festa, já chamada de Nossa Senhora do Rosário, uma festa para toda a Igreja. O Terço precede a Festa de Nossa Senhora do Rosário e se confunde com a própria história da Igreja, quando muitos que não podiam rezar o 150 Salmos o substituíam por 150 Pais-Nossos e Ave-Marias.  Tal como o conhecemos hoje, o Rosário foi dado por Nossa Senhora a São Domingos de Gusmão, fundador dos dominicanos, a fim de que o santo pudesse converter os hereges cátaros no sul da França por meio dessa oração, visto que todos os outros meios tinham sido inúteis. Esse fato – de que o terço foi dado por Nossa Senhora a São Domingos – é confirmado por pelo menos dezesseis Papas. Depois de começar a rezar o Rosário e ensiná-lo aos outros, o sucesso da pregação de São Domingos foi admirável. O Santo Rosário ou a terça parte dele, conhecida como Terço é, então, uma devoção que nos dá a vitória sobre os nossos inimigos, sobre nós mesmos, sobre o mundo e o demônio. O terço é, então, uma arma poderosíssima e nós não podemos negligenciá-la se nos preocupamos com a nossa salvação.

O Terço é tradicionalmente dividido em três mistérios – gozosos, dolorosos e gloriosos. Três mistérios a fim de honrar a Santíssima Trindade; três mistérios para honrar a vida, a morte e a glória de Cristo; três mistérios para nos dar abundância de graças durante a vida, paz na hora da morte e glória na eternidade. São 150 Ave-Marias como são 150 Salmos.

Mas por que o terço é tão eficaz na fuga do pecado e na busca da santidade? Como já mencionamos, ele nos foi dado por Nossa Senhora e recomendado inúmeras vezes por ela, bastando mencionarmos Lourdes e Fátima, aparições ampla e devidamente aprovadas pela Igreja. O Terço é a devoção mais recomendada pelos Papas.

O terço é também uma oração excelente em virtude das orações que compõem o seu corpo. O Credo, que é o resumo essencial das verdades em que devemos crer e que nos coloca na disposição correta para rezar. O Pai-Nosso, que é a oração mais perfeita que existe, pois foi composta e ensinada pelo próprio Verbo de Deus encarnado e que contém tudo aquilo que devemos pedir para nos salvar, começando pelos bem espirituais, mas sem esquecer os bens materiais necessários. A Ave-Maria, que é a saudação do Anjo a Nossa Senhora com as palavras de Santa Isabel também dirigidas à Mãe de Deus acrescidas da súplica da Igreja para que Maria Santíssima reze por nós agora e na hora de nossa morte, que são os dois momentos mais importantes de nossa vida. A Ave-Maria é a oração que mais agrada a Nossa Senhora, pois contém na primeira parte as palavras do próprio Deus e na segunda as palavras dos filho de Nossa senhora. Na Ave-Maria, os dois títulos principais de Nossa Senhora são invocados: a maternidade divina e a concepção sem pecado original. A Ave-Maria é o cântico novo anunciado no Antigo Testamento, nos Salmos em particular, é o cântico da nova e eterna aliança, que começa na Anunciação e se conclui no calvário. O Glória ao Pai recitado após cada dezena do terço expressa nossa submissão total à vontade de Deus, querendo aquilo que for para a sua maior glória, quer dizer, querendo aquilo que o torne mais conhecido, amado e servido pelos homens. Finalmente, podemos citar ainda a oração que foi ensinada por Nossa Senhora aos pastorinhos de Fátima e que implora a misericórdia divina. Disse Nossa Senhora: “Quando rezais o terço, dizei depois de cada mistério: Ó meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno; levai as almas todas para o Céu, principalmente as que mais precisarem.”

Uma objeção comum ao Terço diz respeito à repetição das orações. Ora, a repetição não é algo ruim. Ao contrário. A repetição é ruim e entediante para os sentidos, que buscam sempre novidades. Mas para a inteligência, a repetição é indispensável. A repetição é a mãe do aprendizado e só podemos conhecer algo profundamente quando ele é repetido inúmeras vezes. Assim, as repetições no Terço, como na Missa, permitem que conheçamos o significado profundo das orações e permitem que possamos pedir com verdadeiro conhecimento de causa. Além disso, repetindo as orações, simplesmente imitamos NSJC, que, no momento de sua agonia repetia as mesmas palavras. Essa repetição mostra a profundidade e a intensidade da oração.

Eis, então, o corpo do Santo Terço: as orações que o compõem. Agora precisamos considerar a alma do Terço.

O Terço é uma oração extremamente eficaz também porque ela é ao mesmo tempo uma oração vocal e mental. Ele é uma oração vocal porque recitamos com a boca todas as orações que acabamos de mencionar. Mas o terço, para ser verdadeiramente tal e realmente eficaz, deve ser também uma meditação, uma oração mental. É essa a alma do terço. Isso quer dizer que durante o terço devemos também considerar as verdades eternas expressadas nele e tirar conclusões práticas para nossas vidas. Devemos, então, considerar os mistérios da vida, paixão, morte e glória de Nosso Senhor Jesus Cristo, bem como considerar os mistérios da vida de Nossa Senhora contidos nos quinze mistérios do Terço, procurando imitar os exemplos dados por Cristo e Maria Santíssima.

Mas para obter todas as graças que derivam do terço precisamos rezá-lo bem. Primeiro, devemos estar em estado de graça ou ter o propósito de deixar o pecado mortal, ao menos, pedindo a Deus a nossa conversão. Segundo, devemos evitar distrações voluntárias; evitar todas as distrações involuntárias é praticamente impossível, mas devemos combatê-las e, mesmo se não conseguimos afastá-las de todo, nossa oração será agradável a Deus. Terceiro, é preciso ter atenção quando se reza e no que se reza, sem pular partes das orações e sem rezá-las com rapidez. Quarto, é preciso meditar nos mistérios do terço, considerando o exemplo de Jesus e Maria e tirando uma conclusão prática para nossas vidas. Finalmente, é preciso pedir sempre uma graça, pois só alcançamos aquilo que pedimos, só achamos aquilo que buscamos. Não devemos deixar o terço, caros católicos, para o último momento do dia, em que já estamos cansados e não conseguimos mais nos concentrar devidamente e corremos mesmo o risco de terminar o dia sem rezá-lo.

Parece bem complicado conseguir rezar o Terço, falando as orações e meditando os Mistérios. Há um método simples para unir a oração vocal e mental no terço. Em cada dezena, nas três primeiras Ave-Marias, devemos considerar as palavras das orações que estamos fazendo. Nas três Ave-Marias seguintes devemos considerar o Mistério em questão. Por exemplo, na encarnação, a humildade de Nosso Senhor Jesus Cristo e seu amor por nós. Nas últimas quatro Ave-Marias, devemos inflamar nossa vontade e tirar uma pequena conclusão prática: por exemplo, reconhecendo que todo o bem nos vem de Deus – humildade – ou nos propondo a visitar o Santíssimo Sacramento para expressar nossa caridade para com Deus etc. Esse método pode parecer um pouco artificial no começo, mas se mostra depois muito eficaz contra as distrações e para o progresso da alma, conciliando bem a oração vocal e a meditação.  As dificuldades para se rezar o terço e para rezá-lo bem são inúmeras e o inimigo tentará nos desencorajar ao máximo, sabendo o quanto o terço é essencial para a nossa santificação. Assim, é preciso perseverar apesar das distrações e das inúmeras dificuldades. Não devemos jamais abandonar o Santo Terço.

Aquele que reza o Terço diariamente com uma reta intenção, como Nossa Senhora pediu tantas vezes, há de se salvar, pois como acabamos de ver se trata de uma arma poderosíssima que nos foi dada por nossa Mãe. É preciso que, na medida do possível, se reze o Terço em família e que pouco a pouco as crianças se acostumem a rezar o Terço. A família que reza o Terço junta alcançará de Nossa Senhora graças abundantes para permanecer fiel a Deus nesses tempos de tormentas e para cumprir a finalidade do matrimônio, que é a santificação dos esposos e dos filhos.

O Terço é uma oração simples, perfeita, uma verdadeira síntese da Fé e um resumo do santo Evangelho. E essa oração simples e perfeita nos toma somente alguns minutos por dia. Assim como a rosa é a rainha das flores, o Terço é a melhor das devoções depois da santa Missa, claro. A devoção que mais agrada a Nossa Senhora é o Santo Terço. Se tivéssemos que escolher uma só devoção, excetuando a Missa, teríamos que escolher certamente o Terço. Devemos utilizar essa arma potentíssima para o bem da nossa alma, para o bem de nossa família e para o bem da sociedade. A guerra é tremenda, uma arma como o Terço é essencial. Arma que nos foi dada por Nossa senhora, que é recomendada por Ela e pelos Papas. Arma composta das orações mais perfeitas e mais agradáveis a Deus. Arma que nos faz considerar, pela meditação, os mistérios mais importantes da vida de Cristo e de sua Santíssima Mãe. Arma que nos faz imitar as virtudes de Nosso Salvador e de sua Mãe. Cabe somente a nós utilizar bem essa arma. Quem reza o terço com uma reta intenção, buscando agradar a Deus e se converter, se salvará certamente.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

Nota do editor: destaques são nossos.

[Sermão] A educação católica dos filhos: “Ensinar desde a mais tenra idade a temer a Deus e a se abster de todo pecado.”

Sermão para o 18º Domingo depois de Pentecostes (30 de setembro de 2012) 

Padre Daniel Pinheiro

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria…

“Ensinar desde a sua mais tenra idade a temer a Deus e a se abster de todo o pecado.”   Ab infantia timere Deum et abstinere ab omni peccato. (Tob. I, 10).

A questão da educação é fundamental, caros católicos, sobretudo nesses dias em que a sociedade como um todo se opõe de maneira cada vez mais hostil à lei natural e à lei divina. Da educação que a pessoa recebe na sua mais tenra infância depende o seu futuro, não somente neste mundo, mas também no próximo. De regra, tal a criança, tal o adolescente e tal o adulto. É a partir da educação que a consciência e a personalidade da pessoa são formadas, seja para o bem, seja para o mal. Assim, saber qual é o fim da educação e quais os meios para bem educar os filhos é indispensável para todo casal e educador católico.

Quando falamos de educação é preciso ter um conhecimento claro do homem e de seu estado atual. O homem é composto de corpo e alma. A educação deve prover, então, aos dois. O homem está maculado, ferido, pelo pecado original e sofre suas consequências, isto é, ele tem uma inclinação desordenada nas suas faculdades: quer dizer, a inteligência está inclinada para o erro, a vontade está inclinada para o mal e as paixões estão inclinadas para o bem sensível desordenado. É preciso levar em conta esta desordem nas faculdades do homem para poder educá-lo bem e empregar os meios adequados. Além disso, o homem foi elevado por Deus à vida sobrenatural, de maneira que o fim último do homem é sobrenatural e só pode ser alcançado pela prática da verdadeira religião.

A educação tem como objetivo, então, levar o homem ao seu desenvolvimento perfeito. A perfeição de cada coisa consiste em atingir a finalidade para a qual foi criada. O homem foi criado para Deus e seu fim último é, portanto, Deus. A educação, então, não deve ser naturalista, mas deve considerar não só a natureza do homem, mas a Revelação divina, pela qual o homem é chamado à vida sobrenatural. Uma educação naturalista privaria o homem daquilo para o que ele foi feito (visão beatífica no céu) e seria extremamente danosa e prejudicial não somente para o indivíduo, mas também para a sociedade.

O dever e o direito de educar as crianças e os jovens dizem respeito aos pais, em primeiro lugar. Por lei natural, este dever e este direito são dos pais. A educação das crianças está contida na primeira finalidade do casamento. Esta primeira finalidade visa não somente à procriação, mas também a educação da prole. Não basta gerar o filho, mas é preciso ajudá-lo a desenvolver-se da melhor maneira possível. Em outras palavras: não basta dar a vida, é preciso dar aos filhos uma vida feliz e a vida feliz é a vida virtuosa. Para tanto, é necessário, segundo a natureza humana e salvo situações extraordinárias, que estejam presentes o pai e a mãe, não somente para o sustento material, mas também para a educação espiritual dos filhos, o que vai contra o divórcio, que perturba a educação dos filhos e, consequentemente, toda a sociedade. Nem precisamos falar de como uniões de pessoas do mesmo sexo são extremamente prejudiciais para a criança e toda a sociedade.

Os pais têm pela lei natural o dever e o direito – invioláveis ambos – de educar os filhos. Não se trata de um direito civil dado pelo Estado e que pode ser retirado a qualquer momento. Não. A família existe antes do Estado. O Estado tem, então, uma grave obrigação moral de permitir que os pais eduquem seus filhos. Por outro lado, os pais podem delegar para o Estado a educação dos filhos e podem retratar tal delegação a qualquer momento. O Estado tem direito de interferir nesse direito natural dos pais de educar os filhos somente em uma circunstância: quando os pais estão instruindo os filhos a violar a lei natural de maneira que decorra dano para o bem comum. Para interferir o Estado tem que agir segundo a lei natural e a lei divina. Então, se o Estado quer forçar o aprendizado da educação sexual, por exemplo, ele não tem direito algum, pois assim ele não está garantindo o bem comum, mas indo contra ele, pois viola a lei natural.

O ideal seria que família, Igreja e Estado cooperassem na educação católica de uma criança e de um jovem, evitando assim, a mudança de ambientes, o que é extremamente prejudicial para a educação. Atualmente, isso é, infelizmente, quase impossível.

A educação é dever grave dos pais, pois da educação das crianças depende o futuro delas. Os filhos são como um depósito dado por Deus aos pais e do qual eles deverão prestar contas. A Sagrada Escritura nos diz: “Aquele que educa seu filho (…) quando morrer não ficará aflito e se salvará pela educação deles.” (Eccl XXX, 3- 5: Qui docet filium suum… in obitu suo non est contristastus nec confusus. E 1 Tim. II, 15:  Salvabitur autem per generationem filiorum.)

O fim da educação é a virtude nesta terra, quer dizer a santidade, e a glória eterna na outra vida. Ora, a virtude consiste numa disposição muito bem enraizada para agir bem, fazendo o que é bom, por um bom motivo e nas circunstâncias devidas. Todavia, essa disposição bem enraizada para agir bem, que é a virtude, adquire-se pela repetição dos atos. Assim, quanto mais cedo aprendemos a agir bem, maior facilidade teremos para agir bem posteriormente. Isso quer dizer que a educação deve começar o mais cedo possível, mesmo quando a criança ainda não entende perfeitamente as coisas. Por isso, levamos a criança à Missa desde cedo, ensinamos à criança a rezar, a manter-se bem vestida, a respeitar as coisas sagradas. Em suma ensinamos à criança a evitar o mal e praticar o bem. Aquilo que a criança aprender na sua infância e adolescência dificilmente deixará de praticar na idade adulta. Diz a Sagrada Escritura que mesmo quando a criança envelhecer, não se afastará de seu caminho. Adolescens juxta viam suam, etiam cum senuerit, non recedet ab ea (Prov. XXII, 6).

Além disso, como no início o homem é como uma tábua rasa, aprender o bem é muito mais fácil, pois a criança ou o jovem não tem disposições ruins, além daquelas que são consequência do pecado original. Por outro lado, deixar o mal ao qual a pessoa já se habituou é uma tarefa dificílima. É imperioso, dessa forma, acostumar as crianças desde já a praticar o bem e a evitar o mal. A Sarada Escritura diz: Ensinar desde a sua mais tenra idade a temer a Deus e a se abster de todo o pecado. Ab infantia timere Deum et abstinere ab omni peccato. (Tob. I, 10). Agora, como começar a educação de alguém que ainda não atingiu a idade da razão? Aristóteles e depois São Tomás dizem que a virtude nada mais é do que alegrar-se com aquilo que é bom e entristecer-se com aquilo que é mau. Dessa maneira, a melhor forma de educar uma criança é fazer que ela se alegre com o bem que ela faz e que ela se entristeça com o mal. É preciso, então, recompensar as boas ações e punir as más, mesmo que ela não tenha plena consciência de uma ou de outra. Ela passará a gostar de fazer o bem e odiará fazer o mal. Ela vai aprender com isso, que nossas ações têm uma consequência, merecendo um prêmio ou um castigo nesta terra, mas também depois da morte.

Mas como educar os filhos? Pais, não exaspereis os vossos filhos, mas educai-os na disciplina e na instrução do Senhor, nos diz São Paulo. Et vos patres educate filios vestros in disciplina et correptione Domini (Eph VI, 4). Isto quer dizer que é preciso instruir os filhos segundo a doutrina e discipliná-los, corrigi-los quando agem mal.

Instrução. O primeiro dever dos pais é conformar a conduta do filho à lei de Deus, quer dizer, segundo a lei natural e segundo a Revelação. E os pais devem fazer isso não somente com as palavras, mas também com o exemplo.

Pelas palavras. Os bons pais reunirão com frequência os filhos em torno de si e ensinarão, desde bem cedo, o temor de Deus, o amor da verdade e do bem.  Assim, o primeiro dever dos pais é instruir os filhos quanto à fé, em particular sobre quatro pontos fundamentais: 1) que há um Deus criador de todas as coisas e todo-poderoso; 2) que este Deus é remunerador, premiando os bons e punindo os maus; 3) que há um só Deus em três pessoas; 4) que Deus se encarnou no seio de Maria e que Ele sofreu e morreu para nos salvar. Os pais devem também ensinar para os filhos o fim que devem buscar: conhecer, amar e servir a Deus.  É preciso, então, que os pais tenham o mínimo de conhecimento dessas coisas a fim de transmitir aos filhos. Se eles ignoram tais coisas (o que é grave) eles devem pelo menos enviá-los a alguém que ensine a fé às crianças. É de se lamentar muitíssimo que as crianças cheguem à juventude sem conhecer praticamente nada da religião, como, por exemplo, o que significam o pecado mortal, o inferno, o céu, a eternidade. É de se lamentar também que eles não conheçam as orações mais básicas que todo cristão deve saber, sob pena de pecado grave (Sto Afonso de Ligório):  Pater, Ave-Maria, Credo. Os pais devem ensinar a criança a rezar. A rezar a oração da manhã, a oração da noite. Devem ensinar a pedir perdão pelas suas faltas, a agradecer pelos dons de Deus, a oferecer tudo a Deus. Os pais devem ensinar a devoção à Maria Santíssima, em particular um apreço enorme pelo Terço. Eles devem favorecer o amor ao Santíssimo Sacramento, visitando-o com frequência. A família deve rezar junta. Os pais devem ler bons livros para seus filhos (história da salvação, histórias de santos, e.g.) e dar bons livros para que eles leiam. No momento em que eles atingirem a idade da razão (em torno de sete anos), é preciso habituá-los a frequentar os sacramentos (confissão e comunhão). Com esses bons hábitos bem penetrados na alma, eles perseverarão até o fim. Deus não há de abandoná-los.

Os pais devem ensinar aos filhos as verdadeiras máximas da vida e não as máximas mundanas. Assim, longe dos pais católicos dizer aos filhos: “É essencial ser estimado pelos outros”; “Deus é misericordioso, no final perdoará teus pecados”. Os bons pais têm outra linguagem. Como Santa Branca, mãe de São Luís, eles dizem: “Meu filho, eu prefiro te ver morto no meu braço que em estado de pecado”; ou dizem: “o que vale ganhar o mundo inteiro, se nós perdemos a nossa alma”, ou “tudo se perde, mas não percamos Deus”. E finalmente aquela máxima de São Domingos Sávio: “Antes morrer do que pecar”. Uma dessas máximas bem impressas no espírito de uma criança bastará, como nos diz Santo Afonso, para que a criança se mantenha toda a sua vida em estado de graça.

Os pais, além de ensinar aos filhos, devem governar os filhos de forma a evitar as ocasiões de agir mal, as ocasiões de pecado. É preciso evitar a ociosidade dos filhos, ocupando bem o tempo deles. A ociosidade é ocasião farta para o pecado. David cometeu adultério e homicídio porque num momento de ociosidade levantou os olhos para uma mulher.

É preciso impedi-los de ir a lugares suspeitos e de andar em má companhia. A má companhia é o flagelo da juventude. Os pais devem saber aonde vai o filho quando ele sai de casa, o que ele vai fazer e com quem ele vai. Os pais devem ter cuidado com os empregados e devem demiti-los se eles têm um comportamento ruim. É preciso impedir os jogos de azar (que levam à perda da fortuna e da alma), as danças e bailes, os espetáculos escandalosos, assim como as músicas ruins (e não só por causa das letras, mas da própria melodia, às vezes muito sentimental ou colérica). É preciso evitar os filmes impróprios (aqui estão incluídos praticamente quase todos os filmes atuais e muitos dos antigos), bem como os programas ruins de rádio. É preciso também vigiar as leituras dos filhos, a fim de que não leiam o que vai contra a moral e contra a fé. É necessário ter cuidado com os livros de romances, que tiram a juventude da realidade e a leva por um caminho ruim. E mesmo historinhas de ficção e desenhos para crianças são em grande parte prejudiciais pelo conteúdo – que via de regra é péssimo – mas também pelo fato do excesso acostumar a criança a viver fora da realidade e não gostar da realidade.

Hoje, é preciso tomar cuidado, sobretudo, com a televisão e a internet. A televisão invade de tal maneira a casa das famílias que elas tendem a destruir os lares e vai aos poucos incutindo uma forma de pensar e uma moral não só anticatólicas, mas também antinaturais. A televisão aos poucos substitui o que de bom existe no intelecto da pessoa por valores anticatólicos e antinaturais. Onde ela entra, atualmente, ela destrói tudo. A internet é celeiro do melhor e do pior. Assim, os pais precisam regular e conhecer o que acessam seus filhos, a fim de que eles se edifiquem natural e sobrenaturalmente. E só devem acessar, mesmo coisas boas, quando já tiverem certa idade. Essas coisas, como filmes, cinema, rádio, televisão, internet, são em si indiferentes. Assim, elas podem ser usadas para o bem e para o mal. Atualmente, porém, elas são usadas para destruir não só a realidade sobrenatural (a doutrina revelada por Cristo e afirmada pela Igreja), mas também os princípios mais básicos da realidade natural e as pessoas passam a viver fora da realidade. É preciso, então, cuidado. Pio XI escreveu assim na sua Encíclica Divini Illius Magistri, sobre a educação da juventude:

“Na verdade nos nossos tempos torna-se necessária uma vigilância tanto mais extensa e cuidadosa, quanto mais têm aumentado as ocasiões de naufrágio moral e religioso para a juventude inexperiente, especialmente nos livros ímpios e licenciosos, muitos dos quais diabolicamente espalhados, a preço ridículo e desprezível, nos espetáculos do cinematógrafo, e agora também nas audições radiofónicas, que multiplicam e facilitam toda a espécie de leituras, como o cinematógrafo toda a sorte de espectáculos. Estes potentíssimos meios de vulgarização que podem ser, se bem dirigidos pelos sãos princípios, duma grande utilidade para a instrução e educação, aparecem infelizmente, na maior parte das vezes, como incentivos das más paixões e da avidez do lucro. Quantas depravações juvenis, por causa dos espetáculos modernos e das leituras infames, não têm hoje que chorar os pais e os educadores!”

E acrescentemos por causa da televisão, da internet… Vale mais cansar-se um pouco agora cuidando do filho do que sofrer enormemente depois por tê-lo deixado à mercê de distrações indevidas.

Os pais devem vigiar também pelas obras de arte que estão em seu lar. Os quadros e esculturas licenciosas que geram pensamentos ruins devem desaparecer. Dessa forma, não basta ensinar o bem, mas é preciso vigiar, a fim de que se evite também o mal. Além disso, o que se verá no dia-a-dia de nossa sociedade já basta para que a criança ou o jovem conheça os males do mundo.

Somem-se aos ensinamentos pelas palavras os ensinamentos pelos exemplos. Os filhos têm grande tendência a ver nos pais o modelo e a imitá-los, portanto. O homem acredita mais naquilo que ele vê do que naquilo que ele ouve. Magis oculis credunt homines quam auribus. Assim, se os pais fazem o mal, como podem esperar que os filhos façam o bem? Aos pais que dão mau exemplo, São Tomás os chama de assassinos dos filhos. Não do corpo, mas da alma, claro. Frequente os sacramentos, vá aos sermões, reze o terço todo dia, seja modesto no falar e no vestir, não fale maledicências do próximo, fuja das disputas, abandone a vida mundana, guardem a devida hierarquia no matrimônio e os vossos filhos frequentarão os sacramentos, irão aos sermões, recitarão o rosário, fugirão das garras do mundo, serão obedientes, modestos e assim por diante. Eles imitarão, enfim, vossa conduta.  Isso tem que ser feito enquanto os filhos são crianças. É preciso endireitá-los desde a infância, nos diz a Sagrada Escritura (Eclesiástico 7, 25). Depois dos maus hábitos, fica extremamente difícil convertê-los pelas palavras e mesmo pelo exemplo.

Os pais devem, desde o momento do casamento, rezar pelos filhos, oferecer sofrimentos e penitências pela santificação dos filhos… suportando os defeitos das crianças, oferecendo as noites em claro para cuidar dos filhos, etc.

Querer o verdadeiro bem do filho não é realizar todas as suas vontades, ou dar abundantes brinquedos. Aliás, a abundância de brinquedos acostuma a criança a buscar sempre a novidade e ser superficial e depois ela não conseguirá controlar seus desejos. Querer o bem é permitir e ensinar à criança a fazer a vontade de Deus. Para tanto, é preciso também corrigir o filho, sempre que ele ande pelo mau caminho. A Sagrada Escritura diz: Quem poupa a vara odeia seu filho; quem o ama, castiga-o na hora precisa. (Prov. XIII, 24). A correção, que é aparentemente um mal, visa a um bem infinitamente superior: a virtude, a santidade. Se os pais amam o filho eles devem repreendê-lo e castigá-lo quando ele comete uma falta, mas claro devem castigá-lo de maneira proporcional. Os pais podem mesmo puni-lo fisicamente, mas só durante a infância e de forma moderada, porque eles agem enquanto pais e não enquanto mestres de escravos. O castigo enquanto se está irado deve ser evitado, para não passar além do que é justo e para que o filho não desconsidere a correção, pensando que se trata de um exagero devido à ira (Santo Afonso o diz expressamente).

Os pais devem proteger os filhos evitando todo tipo de pecado e sobretudo os relativos ao uso do matrimônio para que o demônio não seja atraído para a casa. Devem também usar os sacramentais para proteger a família: água benta, objetos abençoados, abençoando a casa…

Eis aqui, então, alguns deveres e direitos para que os pais eduquem bem os seus filhos. Claro, os filhos terão sempre o livre arbítrio e poderão escolher o mau caminho mesmo tendo recebido uma boa educação. Mas isso é relativamente raro. É preciso confiar em Deus.

Aquele que tiver educado bem os filhos neste mundo será dignamente recompensado.  Os pais se assemelham a Deus que por sua Revelação vai nos ensinando o que há de mais importante na nossa vida e nos conduz pela mão a fim de que possamos adorá-lo eternamente. Que os pais tenham na mente esse preceito de Cristo: “Deixai vir a mim as criancinhas” (Mc X, 14).

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Amém.

Nota do editor: destaques são nossos.

[Sermão] Sobre a Fé e os erros opostos

Sermão para o 16º Domingo depois de Pentecostes (16 de setembro de 2012) 

Padre Daniel Pinheiro

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Ave Maria…

Tratemos hoje, caros católicos, de algo fundamental, algo sem o qual – nos diz São Paulo na Epístola aos Hebreus (11, 6) – não podemos agradar a Deus. Tratemos, pois, da fé. São Paulo utiliza hoje uma expressão curiosa: “que Cristo habite pela fé em vossos corações”. A fé está, então, em nosso coração? A fé é, então, um sentimento? Considerar a fé como um sentimento é um erro extremamente atual e que tem causado muito mal para as almas. Esse erro encontra sua origem na doutrina do modernismo, condenada por São Pio X. Negando que nossa razão possa conhecer a existência de Deus e possa receber uma revelação exterior (duas coisas falsas, pois podemos conhecer que Deus existe e podemos conhecer aquilo que ele nos ensina), o modernismo explica a existência da religião a partir de um sentimento interior, o sentimento religioso. As doutrinas das diversas religiões são todas expressões mais ou menos perfeitas desse sentimento e são todas expressões boas desse sentimento. Assim, toda religião que possa manter em uma pessoa esse sentimento religioso é boa. E o importante é que esse sentimento continue vivo, mesmo que para isso eu mude de religião, ou mude a doutrina católica ou mude a interpretação do ensinamento da Igreja. É  exatamente isso que nós vemos hoje: muitos ficam na Igreja Católica enquanto isso lhes agrada, mas se querem divorciar-se e casar-se novamente já não se sentirão bem e procurarão uma seita onde se sentirão bem e estarão, assim – pensam – “de bem com Deus”. Muitos querem mudar a doutrina católica segundo suas vontades e caprichos para se sentirem bem e outros querem reinterpretar os ensinamentos da Igreja. Podemos ver, então, quantos males são causados pelo fato de confundir a fé com um sentimento.

A fé, caros católicos, não é um sentimento e a frase de São Paulo não afirma isso. Para entender bem a frase de São Paulo – “que Cristo habite pela fé em vossos corações” – é preciso conhecer o vocabulário bíblico. O coração na Bíblia é, antes de tudo, a sede da inteligência ou da vontade. Quando São Paulo nos diz que deseja que Cristo habite pela fé em nossos corações, ele deseja, na verdade, que Cristo esteja presente em nossa inteligência pela fé, porque a fé está na inteligência e não nas emoções. A fé é uma virtude sobrenatural, dada pela graça divina, pela qual aderimos à verdade revelada por Deus, em virtude da autoridade divina que não pode se enganar nem nos enganar. Repito: a fé é a adesão da inteligência à verdade revelada por Deus, em virtude da autoridade divina que não pode se enganar nem nos enganar. Devemos ter isso muito claro para não confundir a fé com um sentimento passageiro que vai e vem. Devemos considerar na fé três coisas. De que modo devemos crer, em que acreditamos e por que acreditamos. Em seguida, devemos considerar alguns dos principais erros que se opõem à fé e alguns dos perigos para a nossa fé.

A primeira coisa que devemos considerar na fé é, então, de que modo devemos crer. Quando recitamos o Credo e dizemos “creio”, o que estamos dizendo? Estamos dizendo “eu penso”, “eu acho”, “é possível” ou “para mim é assim”…? Não! Quando dizemos creio ao recitar o credo, expressando a nossa fé, estamos aderindo da maneira mais firme possível, com certeza absoluta e sem nenhuma dúvida àquelas verdades, porque é  Deus quem nos fala e se Deus nos fala nós somos obrigados a acreditar de modo absoluto, porque Ele não pode se enganar nem nos enganar. Devemos crer, então, com certeza absoluta, sem condições nem hesitações… São Paulo nos diz que a fé é a certeza daquelas coisas que não vemos (Heb 11,1). Trata-se, portanto, de certeza.

Em que devemos acreditar com fé? Devo acreditar com fé, quer dizer, aderindo de modo absoluto, em tudo aquilo que Deus nos revelou por escrito ou por tradição e que a Igreja me ensina como divinamente revelado. Isto é, devo aderir de modo absoluto e incondicional a tudo aquilo que a Igreja ensina como revelado, pois a Igreja Católica foi estabelecida por Deus como infalível em matéria de fé e moral. Por exemplo, minha inteligência deve aderir com certeza absoluta à verdade de que Cristo é homem e  Deus, que Maria Santíssima foi concebida sem pecado e subiu aos céus, que o Papa é infalível em certas condições, que a contracepção é imoral etc. Nem todas as verdades de fé estão contidas explicitamente no Credo, mas só implicitamente. Precisamos saber também que não pode crescer o número de verdades reveladas. A Revelação terminou com o último Apóstolo. Depois da morte de São João Evangelista não há revelação de novas verdades. E os dogmas definidos  recentemente pela Igreja não são novas verdades reveladas? Não, esses dogmas não são novidades, mas estavam contidos ao menos implicitamente na doutrina ensinada pelos Apóstolos e pelas Sagradas Escrituras. A Igreja simplesmente explicita e afirma essas verdades em um dado momento da história. Assim, a infalibilidade está presente em Mateus 16, 16: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e tudo o que ligares na terra será ligado no céu e tudo o que desligares na terra será desligado no céu. E as portas do inferno não prevalecerão contra ela.” A Imaculada Conceição está contida na saudação do anjo: “Ave, cheia de graça…” E se não há novas verdades, também não pode haver uma interpretação diferente da interpretação que sempre foi dada aos dogmas. Não se pode dizer que renovação significa comemoração quando se diz que “a missa é a renovação não sangrenta do sacrifício da cruz”. Não. Renovação sempre foi interpretada pela Igreja como a repetição sacramental, não sangrenta do sacrifício de Cristo. Assim, não pode haver novas verdades reveladas nem pode haver mudança de sentido das verdades reveladas. Ambas as coisas seriam adulterar a Revelação para adaptá-la aos nossos gostos e preferências.

Mas por que devemos acreditar de maneira tão absoluta, com a maior certeza possível? Qual motivo leva nossa inteligência a aderir com tal certeza? O fato de ser Deus quem fala e sabermos que é Ele quem fala. Deus não pode se enganar nem nos enganar. E sabemos que é Ele quem fala quando vemos o dedo dEle confirmar uma certa doutrina com verdadeiros milagres e verdadeiras profecias; friso bem: com verdadeiros milagres e profecias. Sabemos que Cristo ensinou aquilo que Ele viu no seio do Pai porque Ele fez inúmeros milagres e profecias. E sabemos também que ele constitui sua Igreja como guardiã infalível da Revelação. Devemos acreditar, portanto, de modo incondicional e total quando Deus nos fala. Não acreditamos porque nossos pais nos ensinaram, nem porque o padre nos ensinou, mas porque Deus nos ensinou e se revelou para nós. Os pais, o padre, são instrumentos de Deus para que os outros possam conhecer os ensinamentos divinos. Mas no fundo, cremos porque Deus nos revelou. E, por essa razão, se deixo de acreditar em uma única verdade revelada proposta como tal pela Igreja – por exemplo, a Imaculada Conceição – perco toda a fé, porque já não acredito porque Deus me revelou, mas por um critério meu, a partir do qual decido o que é verdade ou não. Se deixo de aderir, de acreditar em uma única verdade de fé, perco a fé, deixo de ser católico.

A fé é, então, necessária para a nossa salvação e devemos com frequência fazer atos de fé durante a vida, em particular em momentos de tentação contra a fé e na hora da morte. Evidentemente, nunca podemos negar um só artigo de fé sem perdê-la e às vezes somos obrigados a manifestá-la. Por exemplo, quando a autoridade legítima nos interroga e o silêncio equivale a negar a fé.

Mas se a fé é um bem tão precioso, devemos evitar tudo aquilo que se opõe à fé. Alguns pecados se opõem à fé por excesso e outros por defeito.

Por excesso, opõem-se à fé a credulidade excessiva e a superstição. A credulidade excessiva consiste em admitir com demasiada facilidade e sem fundamento suficiente que certas verdades pertencem à fé. Ocorre normalmente em pessoas devotas, mas ignorantes, que concedem importância extraordinária ao que diz qualquer visionário. A Sagrada Escritura nos coloca em guarda contra essa excessiva credulidade: “Caríssimos, não creias em qualquer espírito, mas examinai os espíritos para ver se são de Deus, porque muitos falsos profetas levantaram-se no mundo” (1Jo 4,1). Mas também não devemos cair no extremo oposto racionalista que duvidaria até mesmo das revelações privadas aprovadas pela autoridade suprema da Igreja, como Fátima ou Lourdes. Em todo caso, as revelações privadas não fazem parte da Revelação com “R” maiúsculo e não há jamais obrigação estrita de acreditar nelas, embora não acreditar possa ser extremamente imprudente nos casos aprovados pela autoridade suprema da Igreja. Devemos ter cuidado, então, com a excessiva credulidade, em aceitar tudo que é tipo de revelação privada. Só podemos aceitá-las quando há a aprovação definitiva e cabal da Igreja, quando há a certeza de que nada nelas se opõe à doutrina da Igreja.

Se opõe também à fé por execesso a idolatria, tributando a uma criatura a adoração devida a Deus. A adivinhação, que tenta averiguar os futuros incertos e coisas ocultas por meios incertos e desproporcionais também se opõe à fé. E assim, a comunicação com demônios, com os mortos, ou outras práticas falsas, a fim de descobrir o desconhecido, consultar horóscopos, astrologia, leitura de mão/quiromancia, cartomante, tarô, búzios, etc. são pecados graves contra a fé e a religião; atribuir importância indevida aos sonhos, presságios… praticar magia ou feitiçaria; jogar com tábuas Ouija ou mesas que giram; praticar o jogo do copo; praticar o espiritismo (falar com os espíritos, invocar os mortos)… Eis aí alguns exemplos de pecados gravíssimos contra a fé e a religião.

Por defeito, também é pecado contra a fé a heresia, que nega uma ou mais verdades reveladas, e a apostasia, que é o abandono total da fé recebida no batismo. A dúvida proposital de qualquer artigo de fé, a ignorância deliberada das verdades de fé que devem ser conhecidas, e a negligência de instruir-se na fé de acordo com o próprio estado de vida também se opõem à virtude da fé. Podemos citar ainda o indiferentismo (que é acreditar que uma religião é tão boa quanto a outra, e que todas as religiões são igualmente verdadeiras e agradáveis a Deus, ou que o homem é livre para aceitar ou rejeitar a religião que quiser); a leitura ou circulação de livros ou escritos contra a crença e a prática católicas, de tal modo a comprometer a própria fé também se opõem à mesma; participar em ato de culto ou liturgia de cismáticos ou hereges; aderir a ou apoiar sociedades proibidas. Para proteger a fé, a Igreja não recomenda o casamento com alguém que não é católico e tal casamento só pode ocorrer com a dispensa da autoridade eclesiástica.

Nós vivemos em um mundo em que há uma crise de fé enorme. Tudo isso que acabamos de mencionar é abundante em nossa sociedade e mesmo entre católicos, desde a excessiva credulidade até o casamento com acatólicos, passando pelas práticas de adivinhação, sempre condenadas pela Igreja. Nós precisamos, então, fortalecer a nossa fé, pedindo a Deus que aumente a nossa, nos dando uma firmeza cada vez maior e fazendo com frequência atos de fé, em particular nos momentos de tentação contra a fé. Devemos também nos instruir segundo o nosso estado, lendo o catecismo de São Pio X ou o Catecismo Romano e outros livros seguros quanto à doutrina católica.

Senhor, vós sabeis que somos homens de pouca fé. Por isso vos pedimos, aumentai a nossa fé para que possamos crer com uma certeza cada vez maior e para que possamos aderir totalmente e profundamente aos vossos ensinamentos e para que possamos conhecê-los cada vez melhor. Assim, poderemos ser agradáveis a Vós e felizes nessa terra, mas sobretudo no céu.

Em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo.

Nota do editor: destaques são nossos.