[Republicação] Texto publicado originalmente em 18 de outubro de 2010
Exposição Dogmática
O Tempo da Septuagésima já nos demonstrou a necessidade de nos unirmos, pelo espírito de penitência, à obra redentora do Salvador. Pelo jejum e outros exercícios de penitência, a Quaresma vai associar-nos a Ele de maneira efetiva. Mas não há Quaresma que valha, sem esforço pessoal de retificação da vida e de a viver com mais fidelidade, reparando, por qualquer privação voluntária, as negligências de outros tempos.
Paralelamente a este esforço, que exige de cada um de nós, a Igreja ergue diante de Deus a cruz de Cristo, o Cordeiro de Deus, que tomou sobre Si os pecados dos homens, e que é o verdadeiro preço da nossa Redenção. À medida que nos aproximamos da Semana Santa, o pensamento da Paixão tornar-se-á predominante, até chegar o momento de prender por completo a nossa atenção. Já desde o começo da Quaresma, ela nos está presente, e é em união com os sofrimentos de Cristo que o exército cristão vai entregar-se à “santa quarentena”, indo ao encontro da Páscoa com a alegre certeza de partilhar da Ressurreição do Senhor.
Eis o tempo favorável, eis os dias da salvação.* A Igreja apresenta-nos a Quaresma nos mesmos termos com que a apresentava outrora aos catecúmenos e aos penitentes públicos, que se preparavam para as graças pascais do batismo e da reconciliação sacramental. Para nós, como para eles, a Quaresma deve ser um longo retiro, um treino, em que a Igreja nos exercita na prática de uma vida cristã mais perfeita. Aponta-nos o exemplo de Jesus e, através do jejum e da penitência, associa-nos aos seus sofrimentos, para nos fazer participar da Redenção.
Lembremo-nos que não estamos isolados, nem somos os únicos em causa nesta Quaresma, que ora se empreende. É todo o mistério da Redenção que a Igreja põe em ação. Fazemos parte dum conjunto imenso, em que somos solidários de toda a humanidade, resgatada por Jesus Cristo. –A liturgia do tempo não se cansará de o recordar. Nas matinas dos domingos, as lições do Antigo Testamento, começadas na Septuagésima, continuam a lembrar, a largos traços, a historia do povo judeu, em que se consignam os desígnios de Deus acerca da salvação de todo o gênero humano o afastamento de Esaú em beneficio de Jacó (não é a linhagem terrestre, mas a escolha gratuita, agora estendida a todas as nações, que faz os eleitos); José, vendido por seus irmãos, e salvando o Egito, é Jesus salvando o mundo, depois de ser rejeitado e traído pelo seus; Moisés, que arranca o seu povo à escravidão, e o conduz à terra prometida, é Jesus que nos liberta do cativeiro do pecado e abre as portas do Céu. Os evangelhos não são menos eloqüentes: a narrativa da tentação de Jesus, mostra o Segundo Adão, novo chefe da humanidade, a contas com as astúcias de Satanás, mas esmagando-o com o seu poder divino; a parábola do homem armado e expulso, por um mais forte, do domínio que usurpara, é ainda afirmação da vitória de Cristo.
Tal é o sentido da nossa Quaresma: um tempo de aprofundamento espiritual, em união com a Igreja inteira, que se prepara para a celebração do mistério pascal. Todos anos, a exemplo de Cristo, seu chefe, o povo cristão, num esforço renovado, retoma a luta contra a maldade, contra Satanás e o homem de pecado, que cada qual arrasta em si mesmo, para haurir, na páscoa, um suplemento de vida, renovada nas próprias fontes da vida divina e continuar a marcha para o Céu.
* Epistola do Primeiro Domingo da Quaresma
Apontamentos de Liturgia
O Tempo da Quaresma começa na Quarta-Feira de Cinzas e termina no sábado Santo. Os últimos quinze dias deste longo período constituem o Tempo da Paixão. Outrora, a Quaresma começava no primeiro domingo, mas os dias que precedem foram acrescentados para perfazer os quarenta dias de jejum. De contrário, ficaria apenas trinta e seis, visto não se jejuar aos domingos.
O jejum de quarenta dias, “inaugurado pela Lei e pelos Profetas, e consagrado pelo próprio Cristo”, foi sempre uma das práticas essenciais da Quaresma. A liturgia a ele alude constantemente, e o prefácio do Tempo recorda-o todos os dias.
Mas o jejum irá de par com a oração, como todos os exercícios penitenciais da Quaresma, é oferecido a Deus em união com o sacrifício do Salvador, diariamente renovado na Santa Missa. Cada dia da Quaresma tem missa própria, devido ao fato de outrora toda a comunidade cristã de Roma assistir diariamente à Santa Missa, durante esta quadra. Daí o indicar-se a “estação”, a Igreja em que se celebrava, nesse dia, a missa da comunidade romana.
Todas as missas feriais incluem, depois da póscomunhão, uma “oração sobre o povo”, precedido dum convite à penitência e à humildade: “Baixai vossas cabeças diante de Deus.” O caráter penitencial é acentuado pelo silêncio do órgão. Os paramentos são roxos. À 2ª, 4ª e 6ª feiras repete-se o trato da Quarta-Feira de Cinzas: “Senhor, não nos trateis conforme merecem os nossos pecados…”.
Rubricas
I. Os domingos da Quaresma são de 1ª classe. Têm sempre Missa e Vésperas. A Quarta-Feira de Cinzas e toda a Semana Santa são férias de 1ª Classe e não admitem nenhuma comemoração.
II. A comemoração da féria é privilegiada: faz-se sempre e antes de qualquer outra.
III. As férias das Quatro-Têmporas são de 2ª classe, e preferidas mesmo às festas particulares de 2ª classe; as outras férias da Quaresma são de 3ª classe e preferidas às memórias e às festas de 3ª classe.
IV. As Quatro-Têmporas da Quaresma verificam-se na primeira semana; seguem as mesmas regras das do Advento.
Texto extraído do Missal Romano Quotidiano de Dom Gaspar Lefebvre
Por que as televisões católicas não transmitem Missas Tridentinas? Estamos numa carência muito grande. Deviam olhar para esse público que também são filhos de Deus.